Justiça Ancilar

Livro da vez: “Justiça Ancilar”, por Ann Leckie.

Breq é uma soldado auxiliar não-humana e solitária em uma missão que parece quase impossível e provavelmente mortal. Encontra Seivarden, um capitã radchaai por quem não tem estima e que pode atrapalhá-la, mas por alguma razão resolve salvar-lhe a vida. Juntas, passarão por várias dificuldades enquanto Breq se aproxima de seu alvo e o leitor conhece algo do seu passado.

Parece promissor, mas quase nada nesse livro me interessou. Depois dos 50%, a leitura até fluiu bem e a intriga política me chamou a atenção, mas não o suficiente para ler os dois volumes seguintes (ah, a incapacidade em contar uma história com começo, meio e fim num único livro…).

Muitos conceitos são estranhos, mas não propriamente originais. A própria Breq me lembrou o tempo inteiro os borgs de Star Trek. Tem essa questão de ela ajudar alguém por quem sequer tinha apreço logo no começo, o que não faz sentido e acontece apenas para possibilitar algo lá na frente. E ainda há a questão do gênero: o império radchaai (o futuro da humanidade daqui a muitos e muitos séculos) não usa nenhum pronome de gênero além de “ela”. Poderia ser interessante se tivesse algum propósito na trama, mas só confunde mesmo.

Para definir o livro em uma palavra: pretensioso.

Estrelinhas no caderno: 2 estrelas

Flores Azuis

Resenha de hoje: “Flores Azuis”, de Carola Saavedra.

Duas histórias cruzadas: uma mulher que envia cartas ao ex após o fim abrupto da relação; um homem recém-divorciado que se mudou para o apartamento daquele ex e resolve abrir as cartas.

A mulher, que assina apenas como “A”, indica já nas primeiras linhas que o relacionamento era abusivo, violento. O recém-divorciado, Marcos, não vê sua filha de três anos como uma criança, mas como mais uma mulher manipuladora, em sua vida. Nenhuma das histórias “de amor” narradas no livro é saudável, nenhum dos protagonistas é equilibrado.

A tensão é suavizada pela alternância das narrativas e por ser uma história curta, menos de 160 páginas. A prosa flerta com o fluxo de consciência, mas insere elementos suficientes do mundo externo para facilitar a leitura. É livro para uma manhã ou tarde, com um desfecho que se abre a múltiplas interpretações. A sensação de incômodo perdura além da leitura, pelo infeliz realismo das histórias e por ser impossível gostar dos protagonistas.

Estrelinhas no caderno: 3,5 estrelas

As Viagens de Gulliver

Livro da vez: “As Viagens de Gulliver”, de Jonathan Swift, leitura coletiva do #projetoexploradores, organizado por @soterradaporlivros@tinyowl.reads@chimarraoelivros e @fronteirasliterarias.

Esperava um livro infantil e, considerando que foi lançado em 1726, cheio de descrições maçantes. Fui surpreendida com um livro interessantíssimo – e para adultos.

Gulliver é um médico muito louco que se mete em muitas aventuras. Não sossega nem depois que casa e tem filhos. Conhece um país de pessoas em miniatura (o famoso Lilliput), outro de gigantes, um cuja capital é uma ilha voadora pronta a esmagar os súditos e, finalmente, um país em que os cavalos são os seres racionais.

A cada viagem, sua crença inicial nas virtudes superiores da Inglaterra é mais e mais abalada. O autor abusa da ironia em críticas mordazes ao parlamento, ao sistema de classes, ao direito, às ciências, à arrogância típica dos ingleses. Considerando a época em que o livro foi escrito, é bastante progressista ao criticar preconceitos e defender que as mulheres tenham a mesma educação formal dos homens.

No Brasil, a maioria das edições é adaptada para crianças e tem apenas as duas primeiras viagens. Na Amazon você pode baixar gratuitamente uma edição com as quatro viagens e um português bastante agradável (boa tradução, sem ser rebuscada nem simplista).

Fico pensando o quanto uma criança de oito ou dez anos – a quem supostamente o livro se destina – é capaz de entender da obra. Se você leu na infância, leia de novo. Se nunca leu, afaste o preconceito e viaje nessas aventuras.

Estrelinhas no caderno: 5 estrelas

Com Sangue

Livro da vez: “Com Sangue”, o mais recente livro de Stephen King, lançado pela @editorasuma. São quatro contos excelentes, e não posso deixar de comentar: que capa maravilhosa!

Em “O telefone do Sr. Harrigan”, o pré-adolescente Craig é contratado por um velho ricaço para ler para ele diariamente, e dessa relação surge uma amizade que continua ao longo do tempo, de forma inusitada. King aproveita para relembrar o surgimento do iphone e a popularização da internet.

“A vida de Chuck” é contada em três atos, mas de forma inversa, começando pelo final. Uma forma incomum de falar sobre morte e, mais que isso, sobre a abrangência da vida.

“Com Sangue” está mais para novela, em razão do tamanho, e dá spoilers massivos dos livros “Mr. Mercedes”, “Achados e Perdidos” e “Outsider”, que não li ainda (a @soterradaporlivros me avisou e ignorei o aviso por minha conta e risco). Nessa história de suspense, a detetive particular Holly Gibney percebe algo estranho durante a cobertura jornalística de um atentado e resolve seguir seu faro, colocando-se em risco.

Em “Rato”, King revisita um velho clichê de suas obras, o professor de inglês e escritor. Drew é um escritor frustrado que acha que dessa vez conseguirá completar um romance e pra isso decide se isolar em uma cabana da família, mas claro que nada será tão simples assim. Acho que, apesar do clichê, foi meu conto favorito.

Na verdade é bem difícil escolher um favorito. King parte de vidas comuns para incorporar o elemento fantástico, e faz isso com perfeição, entregando histórias redondas com finais ótimos. Livro imperdível.

Estrelinhas no caderno: 5 estrelas