Por que gosto tanto de House

Ou “Por que gosto tanto de séries em geral e de House em particular”

Raramente choro com a vida real. Não sou nenhum Chandler Bing, mas o fato é que a última vez que chorei de verdade foi há mais de 2 anos, e eu estava de porre (aliás, a causa do choro era uma tremenda bobagem). A exceção são as despedidas: fico mais sentimental nessas situações e quase sempre acabo chorando.

Já na ficção, afogo-me em lágrimas o tempo todo. Choro com filme sessão-da-tarde, com desenho animado, com comédia romântica. Choro com livros, eventualmente. Já manchei uma tirinha de Calvin e Haroldo. Chorava com novelas, quando as acompanhava. E caio em prantos com seriados. Sério mesmo. Sou capaz de lembrar de um episódio que vi há anos e ficar com os olhos cheios d’água.

Antes que você diga “get a life” ou “mas é só um filme”, esclareço que não sou nenhuma tapada. Sei que tem tanta gente por aí sofrendo de verdade, coitadinhos. Sei que é ridículo chorar por essas bobagens. Tão ridículo quanto torcer até as lágrimas por 11 babacas correndo em volta de uma bola. Estamos conversados?

O lance é que escolho envolver-me a esse ponto com a ficção. É catártico É divertido. É essa mesma capacidade de desligar-me da realidade e entrar na fantasia que me permite sair deliciada do cinema com Indiana Jones, por exemplo, ou rir até hoje de Chaves, ou de um quadro antigo d’Os Trapalhões.

É essa característica, por outro lado, que me impede de ver filmes sanguinolentos/nojentos/aterrorizantes, a não ser em condições especialíssimas. Minha pior experiência no cinema foi Seven. O filme é ótimo, eu sei; só que eu quis sair correndo e, juro, se estivesse sozinha, não teria assistido até o fim. Seria a primeira e única vez em que sairia no meio de uma exibição.

Obviamente, é esse mesmo salto para a ficção que me faz cair em prantos toda vez que vejo a morte do Dr. Mark Greene ou de Edith Keeler. Choro rios no fim de Friends (e, veja só, nem é triste – no máximo, melancólico). E me emociono horrores em alguns episódios de House MD – como, por exemplo, no episódio de ontem, a motivação para escrever esse texto hoje. Season finale. Último episódio da quarta temporada. Na verdade, episódio duplo, embora cada um tenha um nome: House’s Head e Wilson’s Heart. Títulos apropriadíssimos, por sinal.

(Ok, é impossível continuar a escrever sem dar spoilers. Se você ainda – está esperando o quê?! – não viu o fim da temporada de House e não quer estragar a surpresa, pare de ler agora. É sério. Depois, não reclame.)

O Donizetti twittou que o episódio duplo estava entre as melhores coisas que ele viu na tv em todos os tempos. Eu assino embaixo. O interessante é que, na média, esta nem foi a melhor temporada de House. A coisa melhorou mesmo após a greve dos roteiristas (aliás, se mantiverem esse padrão, que façam greve sempre que quiserem). Analisada como um todo, foi uma boa temporada, mas não tanto quanto a terceira, que teve um belo (e grande) arco inicial e terminou de forma tão inusitada que era quase inacreditável, com a remoção de metade dos personagens fixos do seriado.

Parece que a turma que faz House gosta mesmo de subverter a lógica das séries, já que fizeram isso novamente, ao fim da quarta temporada. De um modo primoroso, diga-se. Gradualmente, ao longo de alguns episódios, os roteiristas envolveram o espectador e prepararam o caminho para os 90 minutos mais surpreendentes e intensos que um fã poderia desejar. Nessa hora e meia final, tudo foi muito bem cuidado: fotografia, sonorização, efeitos visuais. A direção foi de babar (curioso que foram dois diretores, um para cada metade: Greg Yaitanes e Katie Jacobs).

O argumento é meticulosamente tecido para conduzir o espectador pelos mesmos labirintos em que House está, fazendo-o chegar às conclusões certas no mesmo momento em que o personagem as percebe.

Os atores, então, estavam em sua melhor forma. Hugh Laurie é bom demais, isso todo mundo sabe. Um sorrisinho ou um olhar traduzem uma gama de emoções. Como em:

– Você está pedindo que eu arrisque a minha vida para salvar a dela?

Há surpresas, porém. House e Wilson não fazem sua dança usual. House não está em condições de ser o sabe-tudo-arrogante de sempre. Wilson não dá conta de ser o grilo falante/melhor amigo. O grilo falante, nesse episódio, é Foreman. A amiga, tanto de House quanto de Wilson, é Cuddy. A arrogância ficou de fora.

Robert Sean Leonard é um espetáculo à parte. O cara sempre foi bom – haja vista Sociedade dos Poetas Mortos -, mas eu não sabia que era tão bom.

A dança das cadeiras, a ousadia em mexer com o estabelecido tem sido um ponto forte de House. Você simplesmente não sabe o que vai acontecer. Na maioria das séries, as coisas são bem mais previsíveis. Em Star Trek, sabíamos que só os camisas-vermelhas morriam nas missões. Em Law & Order, os detetives sempre acabam bem. Em Third Watch, há um verdadeiro massacre contra as unidades de bombeiros e de polícia, e nenhum dos protagonistas morre – só um se ferra, na verdade.

Você não tem essa mesma segurança assistindo a House. Se é óbvio que o personagem-título não pode morrer (não enquanto a série faz tanto sucesso), ele não está, por outro lado, livre de tragédias. Nenhum deles está. Ali, ninguém tem o cartão de saída livre da prisão.

A canção mais característica de House MD, que acaba por definir o seriado, é um clássico dos Rolling Stones. O refrão (e o título) é You can’t always get what you want – você não pode ter sempre o que quer. Isso é seguido à risca pela equipe que faz a série. Os personagens não vivem felizes para sempre.

O último diálogo da temporada retoma a tal canção. House diz para Amber (original – ou quase – aqui):

– A vida não devia ser randômica. Misantropos solitários e viciados deveriam morrer em batidas de ônibus, e jovens de boa-vontade e apaixonadas que foram tiradas de casa no meio da noite deveriam sair ilesas.
– Autopiedade não combina com você.
– Não. Bem, estou lutando entre auto-aversão e autodestruição. Wilson vai me odiar.
– Você meio que merece.
– Ele é meu melhor amigo.
– Eu sei. E agora?
– Eu poderia ficar aqui com você
– Desça do ônibus.
– Não posso.
– Por que não?
– Porque aqui não dói. Eu não quero sentir dor. Não quero ser infeliz. E não quero que ele me odeie.
– Você não pode ter sempre o que quer.

A letra continua: “but if you try sometimes you might find you get what you need” – mas se você tentar às vezes, pode descobrir que tem o que precisa.

Será que essa é uma das vezes para House e Wilson?

Como será a quinta temporada? Destruíram um elemento vital da série – para mim, o elemento vital. Ele será reconstruído? Haverá mudanças radicais? Restarão seqüelas, cicatrizes, isso é certo; mas em que profundidade?

House já aprontou das suas antes, é bem verdade. Atribui-se a ele a culpa pelo fracasso de três casamento do Wilson. Dessa vez… bem, dessa vez, House nem teve a intenção. Racionalmente falando, ele não é realmente culpado. Tudo não passou de uma junção infeliz de fatores. A vida é randômica – e injusta.

Agradecimentos ao Cardoso, que
leu meus lamentos na última semana e não deram spoilers.
E à minha mãe, por ter falado, há uns anos, “Assiste até o fim, que você vai gostar”.
Minhas duas maiores paixões televisivas são culpa dela.
(E quem falar “e pra você, Xuxa” apanha!).

PS: provavelmente, esse artigo mal começa a explicar por que gosto de séries, ou de House

PPS: tem mais spoiler nos comentários.

PPPS: House merecia um universo expandido (não, A ciência médica de House não conta).

Quem é você em Sex and the City?

Quem é você em Sex and the City? Acabei de ver no Chá de Hortelã: Quem é você em Sex and the City? Teste rápido, 15 questões. Perfeito para preparar o espírito para um dos filmes mais aguardados dos últimos tempos (por mim, pelo menos). Sim, Sex and the City[bb] estréia hoje nos cinemas brasileiros e mal posso esperar por uma brecha na agenda que me permita conferir as novas aventuras do mais famoso quarteto de Nova Iorque.

Meu resultado? Miranda Hobbes, claro.

Honestidade e competência são os adjetivos que melhor definem sua forte personalidade. Como Miranda, personagem vivida por Cynthia Nixon no seriado, você acredita em seu trabalho e o executa com grande prazer. Miranda sempre se sente dividida entre a profissional e a pessoa que se diverte e ama, isso pode ser comum na sua vida. Feminista por natureza, você defende seus direitos e de seus amigos com garras, principalmente se forem mulheres. Pode ser um grande desafio para você se permitir ser amada por um homem. Aprender a simplesmente “deixar para lá” certos conceitos podem parecer ferir seu orgulho, mas na verdade são apenas concessões normais para se relacionar com alguém.

Digamos que 90% da descrição batem com esta que vos escreve. E o mais legal é que nem titubeei ao dar as respostas.

Almanaque dos Seriados

Da série Livros Que Não Vou Comprar, Mas Gostaria de Ganhar.

Almanaque dos Seriados Achei ontem essa pérola, numa livraria próxima: o Almanaque dos Seriados é uma verdadeira jornada pelo túnel do tempo (sim, trocadilho infame, eu sei) das séries das últimas décadas. Numa folheada ligeira, sem procurar por nada específico, deparei-me com uma foto do McGyver[bb], outra da tripulação de Star Trek: The Next Generation[bb], uma notinha sobre a Dama de Ouro e uma página inteira dedicada ao Chaves[bb]. Nada mal, nada mal mesmo.

Só não comprei porque, no fundo, não há nada no livro que não possa ser encontrado na internet. Confesso que foi difícil pensar tão racionalmente… Seriados estão entre meus passatempos favoritos, isso não é segredo (e meu perfil no Orangotag está aí para não me deixar mentir).

Será que já tem House M.D. no Almanaque?

Big Brother também é cultura

Big Brother is watching you Essa aconteceu há quase um mês; porém, como a ignorância é atemporal, vale comentar.

O Caje (o equivalente à Febem no Distrito Federal) fez concurso público, dia 27 de abril, para o preenchimento de 127 cargos de agente. Uma das questões da prova dizia o seguinte:

O reality show Big Brother (do inglês ‘grande irmão’ ou ‘irmão mais velho’) tem sido há quase uma década um fenômeno da televisão brasileira. Qual a origem do nome do programa?

Aí, o ilustre (?) deputado distrital Chico Leite, autor de uma tal Lei dos Concursos (um tanto vazia, decididamente eleitoreira – lembre-se, Brasília é a terra dos concursos públicos – e atualmente suspensa devido a uma ação de inconstitucionalidade) enviou à imprensa local a seguinte nota:

O candidato que se dedica horas a fio para se preparar não tem tempo para assistir ao Big Brother. Esse tipo de questão não avalia conhecimento algum.

Puxando a brasa para a sua sardinha, afirmou que a falta de uma lei que dê transparência aos concursos públicos é que gera esse tipo de questão, que considerou “vexatória aos concorrentes que se preparam com afinco e seriedade”.

Ora, excelentíssimo (??) deputado, vexatória é a vossa ignorância.

O uso do termo Big Brother para designar o reality show em que um grupo fica confinado numa casa cercada de câmeras, sob a vigilância constante da audiência, não surgiu do nada. A referência é pra lá de óbvia: “Big Brother”, ou “Grande Irmão“, era o nome dado ao Estado totalitário apresentado no livro 1984[bb], um clássico de George Orwell.

Orwell inspirou-se em seu próprio tempo, dominado por tiranos como Stalin e Hitler, para compor o romance que, publicado em 1948, já é considerado um clássico, dada a qualidade da obra e seu aspecto visionário.

Na ficção de Orwell, o Estado havia se tornado todo-poderoso: onipresente, onisciente e onipotente, o Grande Irmão controlava cada passo de cada ser humano, regulando todos os aspectos da sua vida, mesmo seus pensamentos. Ninguém nunca via o Grande Irmão, mas por toda parte havia cartazes espalhados que proclamavam “Big Brother is watching you” – “O Grande Irmão está observando você”.

Alguma semelhança com o reality show da Endemol que faz sucesso na programação global?

(E, cá entre nós, alguma semelhança com o Google?)

A questão da tal prova era daquelas que privilegiam o conhecimento real, não meramente a decoreba tediosa de leis e regras gramaticais. Era, sim, autorizada no edital, no item Atualidades, sob a expressão “artes e literatura e suas vinculações históricas”. Um simples “Conhecimentos Gerais” já bastaria. Como é que o deputado diz que a pergunta “não avalia conhecimento algum”?! Certamente, avaliou o dele.

Ademais, era uma questão de múltipla escolha. Ninguém precisava escrever um tratado sobre 1984. Só marcar um X.

É certo que o espectador médio do Big Brother nem desconfia que o nome do seu programa favorito veio de um clássico da literatura. Talvez vários candidatos ao cargo de agente do Caje também desconhecessem o fato.

Agora, que o professor (???) Chico Leite desconheça a obra e, ainda por cima, dê provas cabais de sua ignorância é, realmente, de surpreender.

Pena que não é preciso fazer prova para ser político.