Super Size Me – A Dieta do Palhaço

Ficha técnica

Super Size Me. EUA, 2004. Documentário. 98 min. Direção: Morgan Spurlock. Com Morgan Spurlock e Daryl Isaacs.

Para analisar a cultura do fast food, o diretor se transforma em cobaia, alimentando-se durante um mês, três vezes ao dia, apenas no McDonald’s.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

3,5 estrelas

Morgan Spurlock concebeu Super Size Me quando viu o resultado de um processo movido por duas garotas contra o McDonald’s, acusando-o pelas suas más condições de saúde. O juiz declarou que não podia condenar a rede de lanches, por não ter ficado provada a correlação entre a alimentação fornecida por ela e os problemas de saúde das garotas. Spurlock decidiu, então, provar que a correlação existe. Propôs-se a, durante trinta dias, alimentar-se exclusivamente das coisas vendidas pelo McDonald’s.

A idéia foi fazer uma experiência-limite, a fim de medir os efeitos de uma dieta constituída por fast food no organismo e comprovar que ela é prejudicial. Spurlock conseguiu o que queria – todas as suas taxas de saúde (glicose, colesterol etc.), antes perfeitas, alcançaram patamares altissimos e seriamente perigosos à saúde, a ponto de Ter-lhe sido recomendado abandonar a experiência, por não se ter idéia do quão mal ela poderia lhe causar. O aumento de peso também foi considerável: onze quilos em trinta dias – mais de 10% do seu peso corporal (que era de 84,3 quilos) em pouco tempo, o que é sempre perigoso. Um dos médicos apontou que a dieta rica em fast food provou-se tão danosa quanto beber em excesso. O fígado de Spurlock transformou-se em patê. Foram necessárias oito semanas de desintoxicação para voltá-lo a condições aceitáveis, e nove meses para retomar o peso corporal anterior. Os médicos afirmaram que, mesmo tendo feito a experiência por apenas trinta dias, ela foi tão danosa que, possivelmente, a vida e Morgan Spurlock sofrerá algum encurtamento.

A maior crítica ao filme é que ninguém, em sã consciência, come no McDonald’s com tamanha regularidade. A própria lanchonete alegou isso em sua defesa. Ocorre que ela nunca informou que comer fast food com tanta freqüência pode ser perigoso. Ao contrário, incentiva desde a infância o consumo de seus produtos. 72% dos norte-americanos comem no McDonald’s ao menos uma vez por semana. Isso sem falar nas outras lanchonetes. Assim, o grande problema apontado por Spurlock é a falta de informações adequadas aos clientes, aliada a uma campanha publicitária maciça em favor de uma alimentação nada saudável.

Outro ponto interessante refere-se à péssima qualidade dos lanches servidos nas escolas públicas – nada balanceados, gordurosos e incentivadores da obesidade. Some-se a isso o fato de que um americano médio caminha menos de três quilômetros por dia.

O diretor traz alguma influência de Michael Moore ao filme, construindo-o com auxílio de desenhos e não abrindo mão da música. O resultado final é interessante.

Só não sei se serve ao propósito de afastar as pessoas das redes de fast food. Porque eu e a Kika saímos da sessão louquinhas por um lance do McDonald’s.

Nunca vi Big Macs tão bonitos quanto os apresentados por Spurlock…

Efeito Borboleta

Ficha técnica

The Butterfly Effect. EUA, 2004. Ficção Científica. 113 min. Direção: Eric Bress e J. Mackye Gruber. Com: Ashton Kutcher, Amy Smart e Kevin Schmidt.

Homem traumatizado com fatos do passado consegue voltar no tempo e faz mudanças que afetam o presente.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

4,5 estrelas

“É dito que algo tão pequeno como o bater das asas de uma borboleta pode causar um tufão do outro lado do mundo.” Essa frase abre Efeito Borboleta e freqüentemente é utilizada para exemplificar a teoria do caos.

O protagonista sofre de lapsos de memória em situações-limite, desde a infância. Já adulto, descobre que pode usar precisamente esses momentos para alterar uma cadeia de eventos. Inúmeras vezes, tenta fazer modificações para melhorar sua própria vida e a das pessoas que ama – só que brincar com o tempo gera conseqüências imprevisíveis e, freqüentemente, desastrosas.

A trama é bem desenvolvida. O espectador sente-se tentado a prever quais serão as mudanças que cada ação do protagonista acarretará. Mesmo que adivinhe vez por outra, o filme mantém-se interessante por reservar detalhes surpreendentes e, principalmente, pela reflexão que gera: “E se eu tivesse feito isso? E se eu tivesse feito aquilo?”. É muito comum perguntarmo-nos esse tipo de coisa quando desejamos mudar algo cujo resultado não nos foi agradável. Geralmente, inventamos desfechos melhores, ideais. Acreditamos que, se tivéssemos saído de casa cinco minutos mais cedo, não teríamos nos envolvido em um acidente de carro, por exemplo. Só que nos esquecemos da teoria do caos – as coisas não vão, necessariamente, sair da forma que desejamos. Se saíssemos de casa cinco minutos antes, poderíamos ter sido vítimas de uma bala perdida – hipoteticamente, claro.

O filme é realmente muito, muito bom.

Um pouco sobre a teoria do caos

Tradicionalmente, sistemas que não apresentavam qualquer ordem aparente eram descartados pelos cientistas. A partir dos anos 60, alguns deles começaram a tentar explicar tais sistemas, como as gotas d’água que pingam de uma torneira mal fechada e as nuvens de fumaça de um cigarro. Desses estudos, nasceram intrincadas eqüações. O estudo aplica-se a diversos ramos do conhecimento, podendo ser utilizado, por exemplo, para prever ataques epilépticos ou o crescimento de uma população.

A teoria do caos não é uma teoria da desordem, mas uma busca no aparente acaso de uma ordem intrínseca. Uma das principais conclusões da teoria do caos é que o desenvolvimento de sistemas caóticos depende das condições iniciais. Tendo-se como condição inicial uma situação modificada pelo protagonista de Efeito Borboleta, inicia-se uma seqüência de eventos que pode alterar completamente os anos seguintes, de forma aparentemente imprevisível, mas teoricamente passível de ser estudada pela teoria do caos.

(Dia de Folga também é cultura, mas não é plágio. As explicações acima foram resumidas a partir dos textos desse endereço).

Teoria do Caos versus Lei de Murphy

Numa visão simplista (a minha), a teoria do caos é uma forma científica de eqüacionar a famosa Lei de Murphy e seu corolário: se alguma coisa pode dar errado, dará, e na pior seqüência possível.

Bem, estou sendo pessimista. Partindo-se de uma situação inicial qualquer, a cadeia de eventos pode se desenvolver de modo a produzir um resultado bom e desejado.

Ahã.

Teoria do Caos e Parque dos Dinossauros

Lembram-se desse filme jurássico? Um dos principais personagens é o matemático Ian Malcom, estudioso da teoria do caos, que fica horrorizado ao ver a recriação de dinos e tenta demonstrar, com o auxílio da teoria, como a experiência tenderia a uma catástrofe. A teoria é bem explicada no livro de Michael Crichton que deu origem ao filme.

No filme, Malcom estava certo. “Se alguma coisa pode dar errado…” – Lei de Murphy aplicada à teoria do caos.

Fahrenheit 11 de Setembro

Ficha técnica

Fahrenheit 9/11. EUA, 2004. Documentário. 122 min. Direção: Michael Moore. Com Michael Moore.

O documentário procura explicar as atitudes e os interesses políticos do governo norte-americano, chefiado por George W. Bush, depois do atentado de 11 de Setembro. Palma de Ouro no Festival de Cannes. Do mesmo diretor de Tiros em Columbine (2003).

Mais informações: Adoro Cinema.

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4 estrelas

O Michael Moore é um excelente documentarista. Quem assistiu a Tiros em Columbine sabe disso. Em Fahrenheit 9/11, ele consegue prender a atenção do espectador por quase duas horas. Combina edições bem-feitas, entrevistas magistralmente conduzidas, imagens fortes e músicas inusitadas de forma perfeita.

O filme foi feito para que George W. Bush não se reeleja. Não começa com o 11 de setembro, mas com as eleições em que Bush derrotou Al Gore de uma forma um tanto misteriosa. Prossegue demonstrando o descaso com que ele conduziu os primeiros meses de governo – como, aliás, sempre tinha conduzido seus negócios. Dá ênfase às relações da família Bush com os Bin Laden.

O atentado de 11 de setembro é mostrado de uma forma tremendamente impactante – resultado que não seria alcançado se Moore usasse as imagens tão insistentemente divulgadas do prédio em chamas.

O documentário segue mostrando as implicações econômicas do atentado – que rendeu dividendos a muita gente –, as medidas tomadas – muitas delas, absolutamente incoerentes – e o absurdo que foi a invasão ao Iraque, tanto do ponto de vista dos iraquianos quanto das famílias americanas. Tem cenas fortes, mas não há forma suave de abordar a guerra. Só acho que 12 anos como censura é pouco.

Alguns momentos marcantes do filme:

  • a displicência que Bush demonstrou ao receber a notícia do atentado;
  • um parlamentar explicando ao Moore que os congressistas não lêem o que aprovam (você acha que no Brasil é diferente?), em alusão ao “Decreto Patriótico” promulgado em razão do 11 de setembro;
  • Moore desfilando em carrinho de sorvete, na frente do Congresso, lendo o tal Decreto;
  • o enfoque dado à manipulação do medo, feita tanto pelo governo quanto pela mídia – algo que já havia sido abordado em Tiros em Columbine;
  • os inocentes iraquianos atingidos pela guerra;
  • os inocentes norte-americanos atingidos pela guerra.

E outros tantos, que não me vêm à lembrança agora.

Em sã consciência, algum norte-americano teria coragem de dar novo voto ao Bush, após esse documentário?

Ah, sim: ao fim da sessão (que estava lotada em plena quarta-feira, num cinema que nunca enche), o público explodiu em aplausos.

Cazuza – O Tempo Não Pára

Ficha técnica

Brasil, 2004. Drama. 100 min. Direção: Sandra Werneck e Walter Carvalho. Com Daniel de Oliveira, Marieta Severo e Reginaldo Faria.

O filme acompanha a vida de Cazuza (1958-1990), desde o início de sua carreira, quando ele cantava em inglês no Circo Voador, e seu relacionamento com os pais e os amigos.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

4 estrelas

Nunca fui tiete do Cazuza ou do Barão Vermelho, mas sempre curti as músicas, tenho um CD (coletânea), gosto quando toca alguma coisa na rádio. Lembro-me bem das últimas imagens do Cazuza, fraco, debilitado. Lembro o tanto que o desamparo dele me comoveu e, ao mesmo tempo, assustou. Em 1990, eu tinha onze anos, pouca coisa mais velha que a AIDS, da qual pouco se falava, ainda. Dizia-se que era uma doença cruel, mortal e que castigava os gays e os drogados. Sim, eram esses os termos. Não em casa, mas o que eu ouvia na rua passava sempre por aí. A AIDS era um castigo, uma maldição.

Com onze anos, ainda não compreendia a carga de preconceito por trás disso, mas entendia a face da morte apresentada pela AIDS e a dor que ela provocava. Gravou-se na minha memória a imagem do Cazuza como símbolo dessa dor toda. Fui ver o filme já esperando pela dose de sofrimento que, inevitavelmente, ele teria de mostrar. Uma história sem final feliz.

No entanto, Cazuza – O Tempo Não Pára não é um tributo à morte, mas uma ode à vida. O filme apresenta um garoto elétrico, um tanto rebelde, mas também um ser humano doce e sincero. Acima de tudo, fiel a si próprio. Alguém que viveu intensamente, loucamente, sim. Que teve defeitos, virtudes, amigos, amores, aventuras. Compôs grandes canções, fez sucesso, tornou-se o líder de uma das grandes bandas dos anos 80. Cresceu, mas permaneceu menino. Desesperou, mas contou com família e amigos para apoiá-lo. Sofreu, mas teve garra e não desistiu. Vida breve, mas aproveitada, sem dúvida.

O Daniel de Oliveira dá um banho de interpretação e, ao lado da excelente Marieta Severo, diverte e emociona o público. Dá bem para imaginar toda a preocupação que o Cazuza deu à mãe, mesmo assim sempre doce, amorosa, presente. Orgulhosa do filho que tinha, nunca envergonhada.

Vergonhoso foi um comentário cínico ouvido à saída da sessão (não por mim, mas por uma companheira de filme): “Se tivesse usado camisinha, isso não tinha acontecido”. Tem gente que não merece essa classificação, mesmo.

Eu me segurei para não abrir o berreiro nas cenas finais. Ainda assim, algumas lágrimas teimosas caíram.

O filme conta com um elenco de primeira, muito carismático, e um ritmo ágil, incapaz de entediar. Tem cenas feitas para chocar, o que é ótimo. Só desta forma, sem meias palavras, pode-se diminuir a hipocrisia e o preconceito. Se as pessoas devem ser julgadas, que o sejam pelo seu caráter, pela bondade ou maldade que exalam, não por suas preferências sexuais.

Mais um aspecto interessante é a tumultuada relação entre o incontrolável Cazuza e o perfeccionista Frejat, com direito a alguns momentos muito engraçados.