Sob as Escadas de Paris

Filme da vez: “Sob as Escadas de Paris”.

Saudade de uma cabine, né, minha filha? Mas não, ainda não tenho coragem de ir ao cinema. A @a2filmesoficial tem feito cabines virtuais e eu não podia resistir ao convite para ver o novo filme da Catherine Frot, que me ganhou em “Quem me ama, me segue” (um dos últimos filmes que vi no cinema pré-pandemia).

A história começa previsível: uma idosa sozinha tem sua rotina perturbada por uma criança sozinha, tenta se livrar dela, mas acaba se afeiçoando. O que não é tão comum é o background dos protagonistas: a idosa (Christine) é moradora de rua, o menino (Suli) é refugiado e não fala francês.

O filme passeia pela Paris turística, mas se detém na cidade invisível sob escadas e viadutos, repletas de pessoas que tentam sobreviver e manter a humanidade em condições desumanas. Pessoas invisíveis, que ora são escorraçadas, ora encontram alento na bondade que ainda sobrevive.

A trajetória de Christine e Suli me deixou com o coração na mão e lágrimas nos olhos.

Se você já está indo ao cinema, anote a dica: o filme estréia dia 14/10. Se, como eu, ainda não está, em breve estará em um serviço de streaming perto de você.

Estrelinhas no caderno: 5 estrelas

Uma Terra Prometida

Livro da vez: “Uma terra prometida”, de Barack Obama.

Recebi o livro via #netgalley em novembro do ano passado, e o tempo que levei para ler diz mais sobre minha incapacidade de ler dois livros ao mesmo tempo do que sobre o texto. Quando peguei “Uma terra prometida” sem outro livro pedindo minha atenção, a coisa fluiu muito bem.

O livro tem uns trechos meio chatinhos, sim, especialmente quando se embrenha muito na política norte-americana. Outra coisa que é um pouco tediosa (e me pareceu forçada) são as louvações do Obama aos membros da sua equipe.

Por outro lado, achei interessantíssimo quando trata de política internacional (inclusive com rápidas menções ao Brasil). É fascinante ver um pouco da história recente pelos olhos de um dos seus principais protagonistas.

Outra coisa interessante são os momentos de frustração – aparentemente mais frequentes que os de realização – do Obama na tentativa de trazer progresso e de melhorar as condições de vida dos cidadãos sob sua responsabilidade. Os projetos eram frequentemente emperrados por conchavos políticos.

Obama também documenta a radicalização das posturas políticas nos EUA, o crescimento da facção de ultra-direita no Partido Republicano e o surgimento das “fake news” como armas políticas, todos temas que falam de perto à realidade brasileira.

O livro acaba em um ponto decisivo do governo e deixa a vaga promessa de um segundo volume.

Na edição da netgalley, os cadernos de fotografias estão ausentes e há alguns erros (siglas em letras minúsculas, por exemplo) que, presumo, foram corrigidos na versão definitiva.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

Klara e o Sol

Livro da vez: “Klara e o Sol”, de Kazuo Ishiguro.

Klara é uma AA que tenta compreender o mundo enquanto espera por uma criança para chamar de sua. A história se passa em um futuro incerto, nos quais a tecnologia e a ciência avançaram. E mais não digo, para não estragar o prazer das descobertas durante a leitura.

O que me encanta na escrita do Ishiguro é justamente o jogo de esconde-e-mostra que ele constrói. Inicialmente, o leitor está perdido e várias perguntas surgem logo nas primeiras páginas. Aos poucos, as respostas aparecem, nunca por meio de grandes explicações (que poderiam soar forçadas ou enfadonhas), mas por pistas, peças que vão formando um quebra-cabeças.

Em “Klara e o Sol”, Ishiguro explora a solidão, tema recorrente em sua obra. Também fala de amor e morte. Há semelhanças com “Não me abandone jamais” (um dos meus livros favoritos de todos os tempos) e em dados momentos dá pra pensar que “Klara e o Sol” se passa na mesma realidade daquele livro, inclusive em razão de alguns dilemas éticos colocados. A escrita é delicada e brumosa, como nos outros livros do autor.

“Não me abandone jamais” continua sendo meu favorito, mas “Klara e o Sol” é imperdível.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

O Gambito da Rainha (livro e série)

Livro da vez: “O Gambito da Rainha”, de Walter Trevis.

Quis ler o livro antes de ver a série da Netflix e não morri de amores pela escrita de Walter Trevis. O estilo é tão seco que mesmo nas situações mais emocionais é difícil sentir alguma coisa. Beth Harmon é uma protagonista interessante e o livro cobre uma gama variada de assuntos, como abandono, adoção, feminismo, racismo e dependência de drogas, mas o autor passeia por tudo muito rapidamente, sem aprofundar nada e exagerando nos sumários narrativos. Tive a sensação de ler uma notícia de jornal ou, talvez, de assistir um documentário ao estilo antigo, no qual os fatos simplesmente se encadeiam de forma crua.

Trevis parece um escritor impaciente. O tempo todo quer apenas chegar ao grande final, ao desfecho, sem muitas delongas. De fato, o final é satisfatório, inclusive com uma pausa ou outra para que o leitor possa empatizar mais com Beth.

Quanto às descrições das partidas de xadrez, não chegam a ser tediosas, mas acho que o leitor com conhecimento amador do jogo (ou nenhum conhecimento) tenderá a fazer uma leitura em diagonal, buscando as reações e emoções e dando pouca atenção às posições das peças. Foi o que eu fiz.

No geral, um livro decente, mas que promete muito mais do que entrega.

A série, por outro lado, é excelente. A condução é dramática sem ser apelativa e várias lacunas deixadas pelo livro são preenchidas. Uma passagem absolutamente forçada do livro – importante para o desfecho, mas quase um deus ex machina – é brilhantemente corrigida na adaptação da netflix. As atuações são ótimas e dá pra sentir a atmosfera tensa das partidas. As relações entre os personagens são melhor construídas e algumas pequenas mudanças nelas dão mais verossimilhança do que se encontra no livro.

Estrelinhas no caderno: 3 estrelas pro livro e 5 estrelas pra série.