Depois

Livro da vez: “Depois”, livro mais recente de Stephen King.

Jamie Conklin é um garoto de seis anos que vê gente morta, mas não exatamente como em “O Sexto Sentido”. Com ele, o morto aparece por pouco tempo, fala por menos tempo ainda e nem sempre está onde se esperaria. A única certeza de Jamie é que, depois de morta, a pessoa não consegue mentir.

Passa o tempo e o Jamie adolescente vê-se obrigado a ajudar Liz Dutton a resolver um crime. Liz é uma policial à beira de perder o emprego que conhece desde pequeno e sabe do seu poder. Essa ajuda trará desdobramentos e Jamie questionará se o que sabe sobre os mortos é mesmo verdade.

O livro é escrito por um Jamie mais velho, de 22 anos, que consegue dar sentido a coisas que não entendia antes e faz questão de lembrar: essa é uma história de terror. Terror, sim, mas em “Depois” King também lança mão do thriller e faz isso muito bem.

As primeiras páginas me soaram estranhas, como se nem tivessem sido escritas pelo King. A narrativa em primeira pessoa e um tanto imatura me incomodou no início, mas a estranheza passou logo, e o estilo é justificado pelo jovem narrador. O ponto de vista de Jamie é o que torna a história emocionante, no fim das contas.

Nem todos os livros de Stephen King são excelentes e uns poucos me desagradaram mesmo, mas “Depois” é maravilhoso, perfeito e sem defeitos.

Estrelinhas no caderno: 5 estrelas

Trocas Macabras

Livro da vez: “Trocas Macabras”, de Stephen King. Leitura de março do projeto #lendoKing, da @soterradaporlivros e da @seguelendo. O debate será no próximo sábado, 27/03 (se quiser participar, fale com uma das organizadoras).

Na pacata(?) cidade de Castle Rock, estado do Maine, uma loja nova é aberta: “Artigos Indispensáveis”. O gentil Sr. Leland Gaunt é o dono, vendedor e estoquista. Cada morador consegue encontrar na lojinha, quase que por milagre, seu maior objeto de desejo e os preços são quase irrisórios – ou assim parece. Não demora muito pra gente perceber que o Sr. Gaunt chegou pra botar fogo no parquinho.

O xerife Alan Pangborn está de volta, ao lado de uma pletora de personagens. Aliás, esse pra mim é o único defeito do livro: personagens demais, histórias paralelas demais. De qualquer modo, o leitor percebe logo quais são as mais importantes e pode escolher focar nelas.

O tom da história é sobrenatural sem adentrar a fantasia. O tema é recorrente nos livros do King: o Mal em sua missão de corromper as almas humanas. O desenvolvimento da história é ágil e há personagens cativantes, mas lembre-se de não se apegar muito.

Ler King em ordem cronológica é muito recompensador. Em “Trocas Macabras” o kingverso já está bem estabelecido. Castle Rock não é só uma cidade, mas um personagem. Há referências a Zona Morta, Cujo e A Metade Sombria.

E, claro, sempre há uma referência a Star Trek.

Estrelinhas do caderno: 4,5 estrelas

Vestígios do Dia (livro e filme)

Livro da vez: “Vestígios do Dia”, de Kazuo Ishiguro.

Steven, um velho mordomo inglês recorda seus tempos áureos a serviço de um controvertido lorde no período entre-guerras. As recordações se sucedem durante uma viagem pela Inglaterra para encontrar a governanta com quem trabalhou longamente, e com quem espera voltar a trabalhar.

Steven é como um cão fiel – de guarda, não de companhia. Vive para agradar e mal se dá conta das renúncias que fez ao longo dos anos. São sutis as suas demonstrações de emoção, normalmente percebidas por outros e não por ele próprio. A relação com a Srta. Kenton, a ex-governanta, é central no livro e um dos principais pontos de interesse da leitura; o outro é o pano de fundo histórico.

A escrita é penumbrosa, típica de Ishiguro. O autor tem por hábito cativar o leitor aos poucos e emociona não por meio de grandes episódios, cenas apoteóticas ou frases de efeito, mas pelos detalhes da narrativa.

Vi o filme um dia depois de terminar o livro (não, não tinha visto ainda). A fotografia é muito bonita, a reconstituição da época é excelente, as atuações são impecáveis. Fica faltando, porém, a aura brumosa e meditativa do livro. Falta o lento desvelar da mente de Steven. Tudo é mais óbvio e imediato na tela. Provavelmente isso é inevitável, dadas as diferenças entre as mídias, mas o livro sai ganhando por ser mais sutil.

Estrelinhas no caderno: 5 estrelas para o livro, 4 estrelas para o filme.

Escola de contos eróticos para viúvas

Livro da vez: “Escola de contos eróticos para viúvas”, de Balli Kaur Jaswal.

Tag Inéditos de fevereiro de 2020. Cancelei a Tag há um ano e ainda tenho dois livros para ler (além deste, que li semana passada).

Nikki é uma jovem britânica nascida em uma família indiana e tenta conciliar essas duas influências, duas formas distintas de ser mulher e de estar no mundo. Culpa-se pelo desgosto causado aos pais ao abandonar a faculdade de direito, mas está determinada a descobrir seu próprio caminho. Inesperadamente, ele a leva a dar aulas de inglês para mulheres punjabi – aulas que logo se transformam em confidências de fantasias eróticas. Nikki se vê envolvida pela comunidade e interessada nos segredos que ela guarda, que incluem até mortes de moças punjabi.

O livro segue uma fórmula, mas faz isso de forma eficiente. É muito bem escrito, a história e os personagens cativam. Vi-me interessada em Nikki e nas demais mulheres, fiquei curiosa pela cultura punjabi e fascinada pelas misturas e colidências. Dá para dizer que, para Nikki, a cultura britânica triunfa (o que pode ser alvo de críticas dos mais ciosos), mas ela sai diferente do outro lado, influenciada, amadurecida e bem resolvida.

A própria autora é o resultado da mistura de influências punjabi e dos diversos países onde viveu durante a infância e juventude, o que para mim torna o livro ainda mais interessante. Um dos melhores do ano em que assinei a Tag Inéditos.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas