Filmes: os melhores de abril de 2022

De volta à programação normal, mesclando filmes antigos e recentes. Meu favorito do mês foi um antigo, o que tem acontecido com certa frequência.

Para saber onde assistir, baixe o app JustWatch, já que volta e meia alguns filmes desaparecem ou migram de streaming.

Recentes

Frida (2002): acabo de decidir que tudo que seja deste século é “recente”. Eu sabia da relação conflituosa de Frida Kahlo com Diego Rivera, mas foi excelente ter uma ideia mais completa da artista, da sua obra, das suas dificuldades e experiências. Não ganha 5 estrelas por ser falado em inglês com sotaque, péssima escolha. Em compensação, manda bem no elenco, na fotografia e no figurino. 4 estrelas

Suspeita (2019): filme tcheco para a televisão (o título original é “Klec”). Uma idosa solitária é procurada por um sobrinho distante e se sente ouvida e acolhida como há muito não se sentia, mas o sobrinho não é o que parece. 4 estrelas

O Mistério de Henri Pick (2019): uma jovem editora encontra um manuscrito soberbo em uma biblioteca especializada em guardar textos rejeitados. Mas quem teria rejeitado um livro tão bom? Um crítico literário fica intrigado, ainda mais quando descobre que o autor não costumava escrever (nem ler). Dramédia bem conduzida. 4 estrelas

Os Rapazes da Banda (2020): Nova Iorque, 1968. Um grupo de amigos gays se reúne para celebrar o aniversário de um deles. Um antigo colega de faculdade (hétero) do anfitrião aparece e gera conflito. Bom, na verdade o conflito já estava lá, só esperando um pretexto. Ressentimentos, inveja, crises existenciais… Mistura explosiva. Comecei pelo Jim Parsons e pelo Zachary Quinto, fui fisgada pelo roteiro. 4 estrelas

O Golpista do Tinder (2022): sucumbi ao hype e sim, o documentário é ótimo. Também é um tanto deprimente, especialmente pelo final. A ingenuidade de algumas vítimas é surpreendente e a audácia de uma delas é coisa de cinema. 4 estrelas

Direto do Túnel do Tempo

O Terceiro Homem (1949): um homem resolve investigar a morte de um velho amigo e aos poucos descobre que esse amigo não era exatamente flor que se cheirasse. Excelente suspense, com trilha sonora conhecidíssima. 5 estrelas

Quem tem medo de Virginia Woolf? (1966): um professor universitário frustrado e sua esposa, a filha do diretor mais frustrada ainda, travam conhecimento com um jovem professor casal. Segue-se uma sucessão de jogos cada vez mais violentos emocionalmente. 4 estrelas

Filmes: os melhores de março de 2022

Vinte filmes em abril, na tentativa de ver todos os indicados ao Oscar antes da cerimônia. Vai daí que só vi filmes recentes este mês, nada de túnel do tempo dessa vez.

Identidade: esse não foi indicado ao Oscar, mas devia ter sido. Na Nova Iorque do fim dos anos 20, uma negra se passa por branca, mas se reconecta com o passado ao reencontrar uma amiga de sua outra vida. Atuações excelentes. 4 estrelas

Attica: o documentário relata a rebelião de 1971 na penitenciária de Attica. Todas as mortes decorrentes foram pelas mãos dos policiais e nenhum deles foi condenado. Sim, lembra bastante Carandiru, mas em proporções menores – o massacre no Brasil foi muito maior. 4 estrelas

Cyrano: história contada e recontada, mas com uma forte carga dramática nessa versão. Peter Dinklage provavelmente teria sido indicado ao Oscar se o filme não fosse um musical. 4 estrelas

Sem Tempo para Morrer: não botei fé no Daniel Craig quando ele foi escolhido para encarnar o 007 e paguei a língua – seus filmes viraram meus favoritos da saga. A despedida é em grande estilo, com as traquitanas tecnológicas que amamos, pouca objetificação feminina (essa nova fase é muito melhor nesse quesito) e uma dose bem-vinda de drama. 4 estrelas

Belfast: não era meu favorito ao Oscar de melhor filme (era Ataque de Cães), mas é muito bom. Kenneth Branagh mostra, pelos olhos da criança que ele foi, os primeiros momentos do conflito entre católicos e protestantes na Irlanda do Norte. 5 estrelas

Filmes: os melhores de fevereiro de 2022

Sigo no ritmo do Oscar 2022.

Recentes

A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas (netflix): meu longa de animação favorito dessa temporada. Uma adolescente consegue entrar para a faculdade dos sonhos e finalmente encontrará pessoas como ela, mas antes deverá salvar o mundo e, de quebra, entender-se com sua família. Referências a Exterminador do Futuro” e “Eu, Robô”, entre outras. 4 estrelas

Coda – no ritmo do coração (amazon prime): uma adolescente é a única ouvinte de sua família e é apaixonada por música. Termina por ficar dividida entre seguir sua paixão ou continuar a ajudar a família de pescadores, que depende dela. Filme fofo, excelentes atuações, belas canções. A diretora teve uns insights bacanas ao alienar os espectadores ouvintes em algumas cenas, demonstrando como se sentem os surdos na maioria do tempo. 5 estrelas

Four Good Days (google play): após dez anos de vício, uma mulher implora pela ajuda da mãe para se livrar da heroína. Inicialmente a mãe recusa ajuda, em uma atitude tão fria que chega a ser chocante, até que percebemos que essa história é muito longa. Seguir-se-ão quatro dias de convivência e luta. O filme aproveita para criticar o sistema médico norte-americano. 5 estrelas

Mães Paralelas (netflix): parece que o tema do Oscar 2022 é família em geral e maternidade em particular. Duas mulheres se conhecem na enfermaria de uma maternidade enquanto dão à luz, e seus destinos ficarão atados. Em segundo plano, há uma tentativa de recuperar os restos mortais de desaparecidos durante a guerra civil espanhola. Almodóvar em excelente forma – minha única ressalva é o melodrama da cena final. 4 estrelas

Direto do túnel do tempo

Nanook (1922, youtube): considerado por muitos o filme que inaugurou o gênero dos documentários. O diretor acompanha por meses uma família esquimó em sua batalha pela sobrevivência. A narrativa não é cem por cento espontânea, algumas cenas foram “posadas”, mas isso não retira a força dramática daquela realidade inóspita. 5 estrelas

McDonalds, Bolívia e o isso tem a ver com a gente.

Em dezembro passado, uma das notícias mais comentadas na minha timeline do twitter foi o fechamento do McDonald’s na Bolívia. Pra início de conversa, dois esclarecimentos:

  • O McDonald’s não fechou no fim de 2011. Na verdade, foi em 2002. Acontece que foi lançando em dezembro passado um documentário analisando o fechamento (falo dele logo mais) e os desavisados acharam que tudo era absoluta novidade. Pesquisa, oi?
  • Os comunistas de plantão (eles ainda existem, por incrença que parível) apressaram-se a dizer que isso era uma vitória em cima do capitalismo feio-bobo-e-chato blá blá blá. Parece que não acompanham a História. Regimes políticos são incapazes de modificar gostos, hábitos ou padrões culturais. Conseguem, no máximo, sufocá-los, reprimi-los. Um dia a barragem racha, como aconteceu, na ex-União Soviética e em toda a cortina de ferro.

O que aconteceu na Bolívia não foi uma questão política, mas predominantemente cultural, e ligeiramente econômica.

Ligeiramente econômica porque uma refeição na franquia custava o triplo de um almoço tipicamente boliviano, segundo o documentário. Baita diferença, não? Só que aqui no Brasil o McDonald’s também é bastante caro, e as lojas só se multiplicam. Você pode argumentar que as classes média e alta bolivianas são menores que as nossas, mas a rede de lanchonetes lá era bem pequena: oito lojas espalhadas pelas três maiores cidades do país. Não acredito, portanto, que a insuficiência de público devia-se ao preço.

Cheddar McMelt
Uma das minhas refeições nada saudáveis.

E não era mesmo essa a razão. A explicação para, em cinco anos (de 1997 a 2002), o McDonald’s não ter decolado na Bolívia é que o povo boliviano é profundamente ligado à sua culinária local. Valoriza-a, preserva-a, tem orgulho dos seus pratos. Fast food não é pra eles: por lá, comer é um ato demorado, que se inicia pelo preparo lento da comida.

É isso o que explica o documentário Por que quebro McDonald’s?. Como esclarece o cineasta Fernando Martínez, o filme é principalmente sobre a cozinha boliviana, e a cozinha boliviana está profundamente arraigada à cultura do país. Segundo ele, “o documentário é um pretexto para falar da cultura boliviana”.

Isso lembra o movimento slow food, iniciado na Itália em 1986 para defender uma maior qualidade na escolha e preparo dos alimentos, desde o uso de produtos regionais até a volta aos hábitos alimentares pré-fast-food. Lembra também a Carta de São Paulo, movimento iniciado por chefs que buscam a valorização dos produtores locais e o respeito na elaboração da comida e no ato de comer.

Só que na Bolívia não foi preciso a criação de um movimento para revalorizar a cozinha local, simplesmente porque ela nunca foi depreciada.

A antiga dieta do brasileiro, baseada em salada, arroz, feijão e bife, é saudável e equilibrada. Acontece que cada vez mais nos rendemos às comidas congeladas, aos pacotes de supermercado e, claro, ao fast food, tudo em nome da praticidade. Não é à toa que os índices de obesidade têm crescido, especialmente entre crianças (que, claro, aprendem a comer errado com os pais). Ah, mas a gente não pode desacelerar, não pode parar pra comer melhor, não dá, não há tempo, vamos nos atrasar… Se continuarmos com essa síndrome de coelho da Alice, logo mais teremos de diminuir o ritmo não por opção, mas por inúmero problemas de saúde causados por maus hábitos alimentares.

Não é melhor tirar um tempinho a cada dia para comer decentemente?

Em tempo: este texto não é uma campanha anti-McDonald’s. Adoro Cheddar McMelt e saí de Super Size Me morrendo de vontade de comer fast food. Só que não faço disso um hábito – uma vez por mês já é demais.

Referências