Samantha Sweet, Executiva do Lar

Samantha Sweet, executiva do lar
Chick lit de primeiro nível.

Samantha Sweet, executiva do lar é um dos melhores livros chick lit (ou “literatura mulherzinha”) que já li – provavelmente, o melhor.

Dessa vez, a história não gira em torno de namoros atrapalhados, consumismo desenfreado, roupas, divórcio ou maternidade. Samantha é uma profissional muito bem-sucedida que comete um erro e vê seu mundo desmoronar. Então, quase sem dar-se conta (mas não sem sofrer), reconstrói sua vida novamente, de um jeito mais doce, mais simples e, obviamente, melhor.

Minha predileção pelo livro pode ter a ver com as mudanças por que passei nos últimos meses e que me levaram a repensar hábitos e comportamentos, num ritmo muito semelhante ao da protagonista (não, minha vida não desmoronou; às vezes, a gente não precisa de tragédias pra realinhar perspectivas). De qualquer modo, Samantha Sweet, executiva do lar é uma história bem escrita e envolvente.

Sim, é claro que há clichês. Se você parar pra pensar, todo gênero literário tem clichês – são eles que, ora essa, moldam esse tal de “gênero”. Só que este livro de Sophie Kinsella, diferentemente de outros da mesma autora,  tem o grande mérito de dar uma roupagem mais amadurecida aos chavões.

Para quem gosta de chick lit, é um livro imperdível; para quem tem preconceito contra esse tipo de literatura, é um bom lugar pra começar a quebrá-los. De qualquer maneira, é diversão garantida.

Trecho

Se aprendi uma coisa com tudo que me aconteceu, é que não existe essa coisa de maior erro da existência. Não existe essa coisa de arruinar a vida. Por acaso a vida é uma coisa muito resistente. (p. 424)

Ficha

Sushi

Depois de É Agora… ou Nunca, parti para mais um livro de Marian Keyes: Sushi. Dessa vez, já sabia o que esperar e tive exatamente o que pretendia.

O tema é, novamente, a busca da felicidade, acompanhada das devidas reflexões balzaquianas. A história está nas mãos de três protagonistas: Lisa, a implacável diretora de uma revista feminina megabadalada, subitamente transferida para um emprego que está longe de ser o dos seus sonhos; a gentil e doce Ashling, sempre pronta a ajudar, para quem os astros ainda não sorriram nessa vida; e Clodagh, melhor amiga de infância de Ashling, linda, bem-casada, bem de grana e infeliz. As três precisam lidar com suas respectivas famílias – pais pobres, mãe depressiva, filhos endiabrados -, com suas ocupações (carreira, lar, casamento) e consigo próprias, seus valores e prioridades.

Ao redor das protagonistas gravitam variados personagens masculinos, com destaque para o executivo Jack Devine e o sem-teto Boo. Aliás, parece que Marian Keyes sempre coloca alguma questão social em seus livros: em É Agora… ou Nunca, abordava gays e tangenciava a AIDS; em Sushi, cuida da pobreza e dos sem-teto; sempre sem encher a paciência do leitor.

Marian Keyes sabe contar histórias banais sobre pessoas comuns, tornando-as interessantes. A estrutura em capítulos curtos contribui para a fluidez da leitura: você pensa “ah, só mais um capítulo, acaba rapidinho” e, quando percebe, já se foram dez.

Com menos reviravoltas que É Agora… ou Nunca e um tanto a mais de clichês, Sushi não é memorável, mas é divertido.

Ficha

  • Título original: Sushi for Beginners
  • Autora: Marian Keyes
  • Editora: Bertrand Brasil
  • Páginas: 569
  • Cotação: 3 estrelas
  • Compre Sushi.

Alô, Alô, Terezinha

Ficha Técnica

  • Título: Alô, Alô, Teresinha
  • País: Brasil
  • Ano: 2009
  • Gênero: Documentário
  • Duração: 1 hora e 30 minutos
  • Direção: Nelson Hoineff
  • Elenco: Russo, Boni, Dercy Gonçalves e inúmeros artistas, Rita Cadillac e várias ex-chacretes, ex-calouros etc. e tal.
  • Sinopse: Entre os anos 50 e 80, Chacrinha foi o apresentador de programas de auditório mais famoso do Brasil. Irreverente e com um estilo próprio, comandou programas que se tornaram recordistas de audiência e atraíram o gosto popular. Lançou diversos artistas que depois se firmaram na música brasileira e criou as chacretes, que ficaram no imaginário popular masculino.

Comentários

Para quem tem mais de 30, Alô, Alô, Terezinha é obrigatório pelo manancial de recordações e referências. Para quem ainda não chegou lá, é obrigatório pelo resgate de uma fase única da televisão brasileira.

O filme não pretende biografar Chacrinha. Na verdade, perde-se entre fatos e boatos da vida do comunicador. É proposital: o diretor Nelson Hoineff parafrasea Abelardo Barbosa e diz que o filme veio para confundir, não para explicar. Antes de ser uma biografia, é um apanhado sobre a televisão brasileira dos anos 60, 70 e, principalmente, 80.

Os vários bordões estão lá: “Quem não se comunica, se trumbica”, “Ganhou um abacaxi”, “Vocês querem bacalhau?” (surgido quando Chacrinha resolveu ajudar as Casas da Banha a venderem o produto encalhado) e, claro, “Terezinha!”, seguido do coro “uhuuuu”. A clássica “Na televisão nada se cria, tudo se copia” também é do Velho Guerreiro.

O visual era assumidamente kitsch, quase trash, sem outra pretensão além de divertir. Quem não se lembra dos maiôs com lantejoulas e dos shortinhos santropeito? E dos cabelões das chacretes? Nada da padronização da chapinha e do loiro de farmácia. Aliás, como mudou o padrão de beleza. Mulher bonita, hoje, tem que ser esquelética. Nenhuma chacrete era esquelética, e pergunte por aí se não eram consideradas lindas pelos homens.

Falando em chacretes, elas provam que o tempo passa para todos e, geralmente, passa mal. Hoje estão mais pra lá do que pra cá fisicamente, claro, mas o pior é perceber que várias não conseguiram aproveitar o sucesso. Uma ou outra lucrou algo além dos 15 minutos de fama. De todas, a mais bem-sucedida foi Rita Cadillac, sem dúvida. Nas palavras de Helmar Sérgio, “era a mais analfabeta, mas foi quem mais se deu bem”.

Há muitas curiosidades sobre as ex-dançarinas, como a declaração de Rita Cadillac de que o sujeito pra quem ela mais tem vontade de dar é o José Mayer e a informação quase inacreditável de que ela ficou mais de oito anos sem transar. Tem também a Índia Potira, quase como veio ao mundo (rapazes, não se empolguem), e outra chacrete que virou crente. É tanto material que deve sair uma minissérie só sobre elas.

A passagem do tempo refletiu-se também na forma de fazer televisão e, novamente, para pior. Há os que falarão que as chacretes eram um atentado contra o feminismo. Talvez fossem mesmo. Outros dirão que as piadas e trocadilhos do Chacrinha eram de baixo calão, que os calouros eram humilhados. Tudo verdade. Ao menos, porém, a coisa era escrachadamente natural. Não havia pasteurização. Não existia ainda a irritante preocupação com o politicamente correto. Eram tempos mais divertidos.

(Nem por isso, diga-se de passagem, faziam-se concursos para eleger a melhor chacrete-mirim ou coisa semelhante, como fizeram nos anos 90 para escolher a criança de 5 anos que mais descia na boquinha da garrafa, lembra?)

Alô, Alô, Terezinha promove um desfile de artistas. Tem Cauby Peixoto, Rogéria, Jerry Adriani, Wanderlei Cardoso, Roberto Carlos, Elba Ramalho, Biafra, Dercy Gonçalves, Nelson Ned, Elke Maravilha, Gretchen, Ney Matogrosso (“quanto mais nu eu me apresentava, mais o Chacrinha gostava”),  o insuportavelmente arrogante Agnaldo Timóteo, Dercy Gonçalves, Gilberto Gil. É Gilberto Gil quem diz, bem a propósito, que “o humor é cruel“; em vários momentos, o espectador não sabe se ri ou se lamenta a má sorte dos entrevistados, particularmente dos ex-calouros que ganharam abacaxis vida afora.

Tem também Baby Consuelo exorcizando demônios. Alheios, claro. Por telefone. E tem Fábio Jr. emocionado e emocionando ao agradecer seu sucesso ao Velho Guerreiro. E muito, muito mais gente.

Alceu Valença, conterrâneo de Chacrinha, aproveita para oferecer uma explicação para a origem das chacretes, das vestimentas e do comportamento do comunicador: o pastoril, tradicional festejo pernambucano, que traz, entre seus personagens, um Velho piadista (normalmente indecoroso) e pastoras enfeitadas (às vezes, sensuais).

O filme termina com Russo, assistente de palco que ganhou o emprego depois de vencer o concurso do homem mais feio do Brasil. Subindo a ladeira, melancolicamente. A melancolia, aliás, é uma constante no documentário, tanto quanto o riso.

Alô, Alô, Terezinha abusa do deboche, da ridicularização, da vergonha alheia, exatamente como fazia o Abelardo Barbosa. Não é um filme para puritanos, como nunca foi o Chacrinha – embora eu, na minha ingenuidade infantil, não visse nada de mais mesmo nos seus programas. Eram outros tempos, decididamente.

Cotação: 4 estrelas

Serviço

Imagem: divulgação.

Julie & Julia

Ficha Técnica

  • Título: Julie & Julia
  • País: EUA
  • Ano: 2009
  • Gênero: Drama
  • Duração: 2 horas e 3 minutos
  • Direção: Nora Ephron
  • Roteiro: Nora Ephron, baseado no livro Julie & Julia, de Julie Powell, e My Life in France, de Julia Child e Alex Prud’homme
  • Elenco: Meryl Streep, Amy Adams, Stanley Tucci, Chris Messina, Linda Emond.
  • Sinopse: 1948. Julia Child (Meryl Streep) é uma americana que mora em Paris devido ao trabalho de seu marido, Paul (Stanley Tucci). Para ocupar-se, estuda culinária e passa a apresentar um programa de tv sobre o assunto. Cinquenta anos depois, Julie Powell (Amy Adams), prestes a completar 30 anos, está frustrada com sua vida. Em busca de um objetivo, resolve passar um ano cozinhando as 524 receitas do livro de Julia Child, Mastering the Art of French Cooking, e cria um blog para relatar a experiência.

Comentários

Julie e Julia

Filmes de culinária estão se tornando uma categoria à parte. Julie & Julia é mais uma dessas histórias que têm na comida o ponto de partida e, sem querer fazer trocadilhos, é deliciosa.

Diga-se que Julie & Julia não é somente um filme sobre culinária, é um filme sobre blog(ueiros). Impossível não se identificar com os primeiros passos de Julie, a surpresas dos primeiros comentários, o prazer em saber que existe gente do outro lado da tela lendo o que ela escreve. Minhas partes preferidas do filme giram em torno do blog, não da cozinha.

Aliás, o problema de filmes que se passam em duas realidades diferentes é que costumo preferir uma delas e torcer loucamente para que a outra termine logo e tenha continuidade a minha eleita. Por incrível que pareça, embora Meryl Streep esteja ótima como sempre (bastante irritante, mas condizente com a Julia Child original), minha história favorita é mesmo a de Julie. Amy Adams está excelente no papel com o qual sou obrigada a me identificar: 30 anos, servidora pública frustrada com sua carreira e… blogueira.

Ao fim e ao cabo, Julie & Julia usa culinária e blog para falar sobre buscas, metas e realização pessoal. Pode-se dizer que, embora trate de cozinha, é um filme feminista, enfocando a força dessas duas mulheres separadas pela geografia e pelo tempo. Os homens estão lá, sim, como apoio. Elas são as estrelas de suas próprias vidas.

Cotação: 4 estrelas

Curiosidades

Julia Child foi a primeira mulher norte-americana a estudar na famosa escola de gastronomia Le Cordon Bleu.

Meryl Streep é bem mais baixa que Julia Child (que tinha impressionantes 1,90 m.), então foram necessários truques de câmera e de cenário, além de muito salto alto, para fazê-la parecer enorme.

O casal Meryl Streep e Stanley Tucci já havia contracenado no excelente O Diabo Veste Prada.

Nora Ephron, a roteirista e dirtora, é especializada em filmes fofos. Na lista estão, por exemplo, Mensagem para Você, Sintonia de Amor e, meu favorito, Harry e Sally – Feitos Um Para O Outro.

Ainda é possível ler algo do The Julie/Julia Project (o blog que inspirou o livro que inspirou o filme), e Julie Powell mantém outro blog em atividade, o What Could Happen?.

O primeiro post do blog original fala em 536 receitas. O filme repete o tempo todo que são 524.

Segundo o IMDB, Julie & Julia é o primeiro filme com importância baseado em um blog.

Serviço

Imagem: divulgação.