É tão bom NÃO comprar!

Tive uma fase em que precisava comprar para me sentir feliz – ou assim achava. Era impensável não passear no shopping pelo menos uma vez por semana (frequentemente duas) e, claro, sempre voltava com uma sacolinha: um “mimo”, um “presentinho para mim”, um “eu mereço”. Isso sem falar nas compras por internet, ainda mais impulsivas.

Essa fase durou uns três anos e lotou meu armário de tralhas. Não gerou dívidas, mas nem quero pensar no dinheiro que poderia ter economizado – e que seria muito bem-vindo agora, quando estou reformando meu futuro lar-doce-lar. E o tempo que perdi, então? Tempo que poderia ter usado em leituras, brincando com minhas gatas, vendo meus seriados favoritos, escrevendo ou até dormindo (coisa que acho o maior desperdício, ou melhor, o segundo maior desperdício, hoje em dia).

Em outubro de 2010, decidi parar de comprar roupas e usar só o que tinha no armário por seis meses, que viraram sete (um dia ainda detalho a experiência aqui, prometo). Quando esse tempo acabou, eu tinha doado sacolas e mais sacolas de roupa. Pelo menos um terço do meu armário foi embora nesse período. Apesar disso, continuei com muita roupa.

Durante 2011, não se passou uma semana sem que eu tirasse ao menos uma peça de roupa do meu armário. Ainda assim, continuo tendo muita roupa.

Em 2011, depois de encerrado o desafio de usar tudo que tinha no armário, limitei minhas compras ao essencial, ou quase:

  • um par de tênis de corrida, em substituição ao que furou (e porque é complicado ter apenas um par, quem corre na rua sabe disso)
  • dois shorts de corrida
  • uma bermuda justa para fazer musculação e correr nos dias mais frios
  • dois sutiãs para o dia-a-dia, em substituição aos que estavam muito usados
  • um vestido preto (comprado para uma ocasião que acabou não acontecendo – eu poderia ter evitado essa compra)

Em 2012, engatei no desafio de ficar um ano sem comprar. Houve poucas exceções até agora, exceto com a reforma da casa, assunto para outro texto. No quesito roupas, as únicas exceções foram dois pijamas bem quentinhos (porque meu único pijama estava velhíssimo, depois de dois anos de uso) e uma camisola de manga longa (deveria ter comprado de manga curta e estou pensando seriamente em retirar as mangas).

Hoje, meu armário está reduzido à metade do que era em 2010, e não me falta roupa alguma. Se por um lado isso deixa claro o quanto desperdicei meu tempo e meu dinheiro em anos anteriores, por outro tenho a enorme satisfação de saber, racional e emocionalmente, que não preciso passar horas andando em shoppings, provando roupas, comprando acessórios. Tenho mais do que preciso, tenho criatividade para mesclar as minhas peças, tenho tempo e dinheiro a mais, não tenho que me desgastar batendo perna por aí, não tenho que me preocupar com modismos ou tendências, não tenho que consumir só por consumir.

A felicidade não está em comprar roupas, livros, carro novo ou o que quer que seja. Está, sim, em ter satisfação verdadeira com a vida que se leva. Não aquela satisfação momentânea, eufórica, tão similar à causada por cigarros, bebida ou qualquer outra droga, mas sim a satisfação cotidiana, tranquila e calma.

É Tudo Tão Simples

É Tudo Tão Simples - capaDos livros da Danuza, meus favoritos são Quase Tudo (sua autobiografia, nada menos que fascinante) e Na Sala com Danuza, uma revolução no tocante ao ensino de boas maneiras (e que deveria ser leitura obrigatória nas escolas). Os outros todos são apenas mais ou menos. Gosto de uma crônica ou outra, adoro quando ela usa de ironia ou escreve sobre os gatos e, no restante do tempo, só acho legalzinho. É Tudo Tão Simples segue esse caminho.

Várias amigas me disseram que eu tinha que ler o livro, que é a minha cara. Realmente, Danuza começa falando em passar adiante tudo aquilo que está sem uso, entupindo armários: prataria, cristais, porcelanas. Admite, no entanto, que tem mais roupas do que precisa e não consegue se livrar delas. Até aí, tudo bem. É logo nesse início que ela escreve uma das melhores frases do livro: “Andei pensando nessa história de simplificar, e vejo que passei a primeira metade da minha vida querendo ter as coisas – todas as coisas – e estou passando a segunda metade querendo me desfazer das coisas, e ficar apenas com o essencial”. Bacana, não é?

Só que essa vontade toda de simplificar não aparece em boa parte do livro, que contém listas e listas do que pode e não pode, deve e não deve, do que é essencial numa viagem etc. e tal. Além disso, há um certo choque diante da tecnologia, e também dos novos modelos familiares, que me soaram estranhos vindo de quem tem uma vivência tão grande, andou pelo mundo inteiro, conhece tanta gente diferente. Bom, pode ser só pra fazer graça.

Tem também a contradição. Lá pelas tantas, ela diz: “Se me oferecessem uma volta ao mundo em hotéis trinta estrelas, tudo de graça, mas que eu não pudesse comprar rigorosamente nada, eu não iria”. Sério?! Será que isso é simplificar? Eu iria, Danuza! Se te oferecerem, pode aceitar e passar pro meu nome, tá?

E será que mulher ainda precisa de homem pra viver bem e feliz, como ela quer fazer crer? Será que não existe diferença entre comer carne e usar um casaco de pele? Será que a gente precisa se preocupar tanto com as aparências? Será que a gente precisa mesmo ter tantas coisas no armário (jeans desbotado, dois jeans brancos, muitas bolsas, um all star, um blackberry, um ipad etc.)? Será que não dá pra sair com mães e conversar de outra coisa que não sejam seus filhos?

A minha implicância principal é com a ideia errada que o título e as primeiras páginas passam. O livro tem pouco a ver com simplificação, com levar uma vida mais leve (outra passagem em que ele tem a ver com tudo isso é quando ela trata dos saltos altos e da tortura que podem representar). Mais precisamente, ele é um esboço do mundo de hoje, com todos os seus apelos ao consumo, os milhares de gadgets – e as pessoas incapazes de se conectarem com outros seres humanos a não ser por meio dessas telinhas tecnológicas -, a dificuldade que é organizar um jantar em família, as obrigações sociais e os modos de fugirmos delas… A vida atual é, realmente, bem complicada. Se não soubermos administrar nosso tempo e fazer valer nossa vontade, ela nos engole. Danuza admite e trata disso mas, exceto por um ou outro insight, ela parece ter bem pouca vontade de simplificar.

Apesar de tudo isso, o livro vale pelo olhar crítico e pelas boas risadas que proporciona. E, claro, pelas dicas de boa educação – com o uso do celular, por exemplo -, artigo cada vez mais raro.

Trechos

Andei pensando nessa história de simplificar, e vejo que passei a primeira metade da minha vida querendo ter as coisas – todas as coisas – e estou passando a segunda metade querendo me desfazer das coisas, e ficar apenas com o essencial. Bem curiosa, a vida. (p. 16)

E por falar em lição, aí vai outra, de autoria de Ingrid Bergman: “Para ser feliz, é preciso ter uma boa saúde e uma péssima memória.” (p. 34)

Na hora de comprar, esteja segura; na dúvida, não compre, e tendo certeza, ainda assim, duvide. O grande segredo é conhecer seus limites. (p. 35)

Depois da separação, é importante que haja uma quarentena para que os novos solteiros voltem a se mostrar em público, já com seus novos amores. Apenas uma questão de delicadeza. (p. 48)

As famílias gastam uma nota, às vezes acima de suas posses, mas querem tudo a que têm direito, e ouvi falar de um [casamento], recentemente, que custou quinhentos mil, e depois o casal foi morar num apartamento alugado. (p. 53)

Como as mulheres mais elegantes que existiram no mundo – Audrey Hepburn, Jacqueline Kennedy, a duquesa de Windsor – jamais usaram salto altíssimo, sempre salto pequeno, isso me anistia a nunca mais tentar usar salto alto, que faz de mim a mais infeliz das criaturas. (p. 54)

Ao contrário do que se diz, amigos existem na hora em que a vida está péssima. Mas se ficar tudo maravilhoso, prepare-se para momentos de grande solidão. Costuma ser difícil suportar o sucesso dos outros. (p. 65)

Se ligar para o celular de alguém, a primeira coisa que deve perguntar é: “Você pode falar?” (p. 71)

Meus amigos já sabem: quando estão comigo desligam o celular, e se algum esquece, eu reclamo, reclamo mesmo, e até acho que perdi alguns (amigos, não celulares) por isso. E tem alguma coisa pior do que achar que está com uma pessoa, e ela estar conversando com outra? É a maior solidão do mundo, mas tem pior, sim: outro dia eu estava na casa de uma amiga, éramos seis pessoas. Pois acredite: cada uma delas estava com uma maquininha na mão. Uma tuitava, a outra mexia no iPad, outra mandava uma mensagem, e depois soube: tinha um que se comunicava com outro que estava na mesma sala, dá para acreditar? Pois eu estava lá, vi, e me senti mais só do que se estivesse perdida no deserto do Saara. (p. 72)

Está meio na moda achar que é elitismo falar de maneira correta, comer de maneira correta, que é preconceituoso achar que cortar o bife com os dentes é feio. Não é; isso se fazia na Idade da Pedra, mas fomos nos civilizando e aprendemos a conviver mais educadamente. A boa educação não é artigo de luxo, mas de primeira necessidade, e não é preciso ser rico para ser educado. (p. 77)

Palitos, ah, os palitos. Só no banheiro, sozinha, de luz apagada. (p. 82)

Se me oferecessem uma volta ao mundo em hotéis trinta estrelas, tudo de graça, mas que eu não pudesse comprar rigorosamente nada, eu não iria. (p. 103)

Cada vez que eu viajo penso que pode ser a última, então não deixo de fazer nada; e se tiver sido mesmo? E não esqueça a regra de ouro: quanto mais pobre o lugar para onde você vai, melhor deve ser o hotel – e vice-versa. (p. 106)

Passaporte, dinheiro, passagem de volta, cada um fica com os seus, mesmo viajando com o marido, com quem é casada há trinta anos. E se brigarem? (p. 108)

Volte uns quatro dias antes de recomeçar o trabalho, para se refazer das férias. (p. 108)

E tem aquela história de um conhecido banqueiro, fóbico: Ao ser perguntado “Mas o sr. não sente saudades de viajar?”. Ele respondeu: “Meu filho, depois do advento do Google, isso tudo está superado.” (p. 112)

Aos 15 anos muitas delas [das crianças] já conhecem o mundo tudo, mas não sabem de nada; ok, aprenderam a comer escargots, mas isso é pouco, do ponto de vista cultural, mesmo que se esteja falando de cultura gastronômica. (p. 112-113)

Depois dos quarenta, não dá para tomar café da manhã, almoçar e jantar, nem em viagem, nem nunca. (p. 118)

Segundo Chanel, se você tiver até 1,60m de altura, não deve nunca usar saltos altíssimos, porque não adianta; vai continuar pequena, e a perna vai ficar do tamanho do salto, em total desproporção. (p. 135)

Prepare-se para receber dos seus queridos filhos telefonemas do carro – e só do carro -, quando estão indo do trabalho para casa. Do escritório não podem, pois estão muito ocupados, e de casa não podem, para não roubar um minuto do tempo dos cônjuges, que vida. (p. 170)

Pense bem antes de tomar certas decisões, tipo morar sozinha e ser livre, pois todas as decisões implicam riscos. Um deles é você se acostumar, e nunca mais querer morar com ninguém. (p. 179)

Nenhuma mulher, com um mínimo de brio, fica com um homem que não a ame apaixonadamente. (p. 186)

“A humanidade está três drinques atrasada”, disse Humphrey Bogart em 1950, e continuou: “Se Stalin e Truman tomassem três drinques agora, o mundo não precisaria da ONU.” (p. 191)

Ficha

  • Título: É Tudo tão Simples
  • Autor: Danuza Leão
  • Editora: Agir
  • Páginas: 192
  • Cotação: 3 estrelas
  • Encontre É Tudo Tão Simples.

Listas, listas e mais listas.

ChecklistNo texto de fevereiro sobre o ano sem comprar, comentei da listinha que estou fazendo das coisas que pretendo comprar ano que vem. A Karla comentou sobre o amor que ela tem por listas e, devo confessar, partilho o sentimento.

Faço listas de tudo:

  • filmes que vi a cada ano
  • livros lidos, também por ano
  • filmes que quero ver
  • livros que quero ler
  • musicais que quero assistir
  • sonhos de consumo
  • posts que quero escrever
  • coisas que quero ver quando visito alguma cidade
  • listas em sites de compra, como Submarino e Amazon
  • listas de listas, como esta
  • etc. etc. etc.

Já fiz lista de roupas que precisava comprar, de resoluções de ano novo (que não faço mais há anos), de coisas para arrumar nos blogs (essa está zerada há muitos meses)… Faço lista de compras de supermercado. Tenho as mais diversas listas publicadas no Dia de Folga. Listo prós e contras para tomar decisões (hábito aprendido com a Rory).

Mantenho a maioria delas no evernote e também jogo lá anotações que sozinhas formam uma lista, como a pasta das receitas que quero testar. Alguns painéis do meu pinterest também funcionam como listas. O Delicious é uma lista de links. Há uma infinidade de serviços online para a criação de listas e já usei alguns deles. Tem também o Wishlistr, o Wishlist.com

Ao contrário do que você possa pensar, não faço tantas listas pensando em aumentar a produtividade, ou só para ser mais organizada. Faço listas porque gosto, porque me dão prazer, porque me divirto ao escrevê-las e ao riscar itens cumpridos. A organização é um bônus.

Semana passada, li uma proposta interessante: listar as coisas que eu não preciso comprar. Às vezes, quando gostamos muito de algum item específico, compramos mais do que damos conta de usar. Já fui assim com itens de papelaria, maquiagem, livros, chás… Desde 2010, estou bem controlada – e mais ainda agora, com o ano sem compras.

Você pode aproveitar a ideia: passe por cada cômodo da sua casa, abra das gavetas e armários e descubra quais são as coisa que você não precisa comprar. Talvez você tenha um estoque enorme de hidratantes ou sabonetes, talvez tenha mais tipos de macarrão do que dará conta de comer nos próximos meses, ou a quantidade de camisas brancas no armário seja excessiva. Vá reparando e preenchendo sua lista das não-necessidades. Esse é um exercício bem interessante para ver pra onde estão indo o dinheiro e o espaço da casa.

Você também gosta de listas? Tem o hábito de fazê-las? Como as anota? Caderninho, agenda, serviços online?

Imagem: Fanginhoon, royalty free.

Um Ano Sem Comprar – Fevereiro

Fevereiro foi o mês de investir em fotografia, um dos meus hobbies – e uma das exceções que abri ao ano sem compras desde o início.

Ultimamente ando sem vontade de sair pra fotografar. Em parte, porque estou meio enjoada de ver sempre as mesmas coisas em Brasília, e com pouca criatividade para pensar em locações e ângulos novos; em parte porque o clima não tem ajudado, com essa alternância entre dias escaldantes e chuvas torrenciais dos últimos meses.

Então, tenho aproveitado para revisar, retocar e apagar fotografias de passeios anteriores. É um trabalho lento mas divertido, quase como se eu viajasse novamente olhando as fotos , catalogando, escolhendo as melhores, pensando nas legendas que vou colocar depois de imprimi-las…

Parênteses: sim, imprimo minhas fotos favoritas. Não gosto de tê-las só em meio digital, e ontem lembrei-me de uma das razões pra isso: eu devia ter as fotos de uma viagem feita em 2011 em três dispositivos diferentes (três!) e, quando fui procurar, não estão em lugar nenhum – a pasta sumiu, tomou doril…  como ainda não tinha feito a seleção para imprimir, nem as fotos em papel eu tenho. Oh céus, oh vida, oh azar.

Voltando ao assunto: no fim do ano passado, comecei a me interessar por fotolivros. São bonitos, práticos, ocupam menos espaço que álbuns convencionais e, como a partir da vigésima página você paga a mais por cada uma, forçam uma escolha bem exigente das fotos – entram só as melhores, mesmo. Em fevereiro montei e mandei imprimir meu primeiro fotolivro.

Só que… pra montar o fotolivro, tive que comprar uma coisinha, sabe… um software. Pesquisei horrores, testei 18 programas diferentes – entre pagos e gratuitos – e o melhor deles, disparado, sem qualquer dúvida, cutando os traseiros dos concorrentes, foi o FotoFusion, da LumaPix. E eu jurava que tinha criado uma exceção para insumos fotográficos, mas vi hoje que minha exceção foi especificamente para a compra de uma lente fotográfica…

Bem, agora já era. Estou feliz com a aquisição. Já montei o segundo fotolivro e estou em vias de começar o terceiro. O programa não é tralha, não é inútil e não podia ser substituído por algo que eu já tivesse. E provavelmente não vou mesmo comprar a lente esse ano, já que não estou empolgada pra fotografar por aí, então vou considerar que ficam elas por elas (na verdade, saí no “lucro”, porque a lente é bem mais cara do que o software).

No mais, ando precisando de um descascador de legumes, de um cortador de ovos, de um copo graduado… Em fevereiro, comecei a fazer uma lista das coisas que desejo comprar ano que vem. Não que pretenda estourar o limite do cartão de crédito em 2013, nem “compensar” o ano sábatico. Só acho que essa lista ajudará a organizar as compras futuras e separar o que é necessidade do que é simples capricho. Quando a reler, no ano que vem, certamente perceberei que anotei algumas coisas das quais acabei nem sentindo falta o ano todo. Isso me ajudará a consumir racionalmente.

Mas provavelmente comprarei o copo graduado logo, porque as marcações do meu estão praticamente ilegíveis!

Leia os outros relatos mensais no fim do texto de abertura deste projeto: Um Ano Sem Comprar – Um Ano Sabático.