Klara e o Sol

Livro da vez: “Klara e o Sol”, de Kazuo Ishiguro.

Klara é uma AA que tenta compreender o mundo enquanto espera por uma criança para chamar de sua. A história se passa em um futuro incerto, nos quais a tecnologia e a ciência avançaram. E mais não digo, para não estragar o prazer das descobertas durante a leitura.

O que me encanta na escrita do Ishiguro é justamente o jogo de esconde-e-mostra que ele constrói. Inicialmente, o leitor está perdido e várias perguntas surgem logo nas primeiras páginas. Aos poucos, as respostas aparecem, nunca por meio de grandes explicações (que poderiam soar forçadas ou enfadonhas), mas por pistas, peças que vão formando um quebra-cabeças.

Em “Klara e o Sol”, Ishiguro explora a solidão, tema recorrente em sua obra. Também fala de amor e morte. Há semelhanças com “Não me abandone jamais” (um dos meus livros favoritos de todos os tempos) e em dados momentos dá pra pensar que “Klara e o Sol” se passa na mesma realidade daquele livro, inclusive em razão de alguns dilemas éticos colocados. A escrita é delicada e brumosa, como nos outros livros do autor.

“Não me abandone jamais” continua sendo meu favorito, mas “Klara e o Sol” é imperdível.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

Trocas Macabras

Livro da vez: “Trocas Macabras”, de Stephen King. Leitura de março do projeto #lendoKing, da @soterradaporlivros e da @seguelendo. O debate será no próximo sábado, 27/03 (se quiser participar, fale com uma das organizadoras).

Na pacata(?) cidade de Castle Rock, estado do Maine, uma loja nova é aberta: “Artigos Indispensáveis”. O gentil Sr. Leland Gaunt é o dono, vendedor e estoquista. Cada morador consegue encontrar na lojinha, quase que por milagre, seu maior objeto de desejo e os preços são quase irrisórios – ou assim parece. Não demora muito pra gente perceber que o Sr. Gaunt chegou pra botar fogo no parquinho.

O xerife Alan Pangborn está de volta, ao lado de uma pletora de personagens. Aliás, esse pra mim é o único defeito do livro: personagens demais, histórias paralelas demais. De qualquer modo, o leitor percebe logo quais são as mais importantes e pode escolher focar nelas.

O tom da história é sobrenatural sem adentrar a fantasia. O tema é recorrente nos livros do King: o Mal em sua missão de corromper as almas humanas. O desenvolvimento da história é ágil e há personagens cativantes, mas lembre-se de não se apegar muito.

Ler King em ordem cronológica é muito recompensador. Em “Trocas Macabras” o kingverso já está bem estabelecido. Castle Rock não é só uma cidade, mas um personagem. Há referências a Zona Morta, Cujo e A Metade Sombria.

E, claro, sempre há uma referência a Star Trek.

Estrelinhas do caderno: 4,5 estrelas

Escola de contos eróticos para viúvas

Livro da vez: “Escola de contos eróticos para viúvas”, de Balli Kaur Jaswal.

Tag Inéditos de fevereiro de 2020. Cancelei a Tag há um ano e ainda tenho dois livros para ler (além deste, que li semana passada).

Nikki é uma jovem britânica nascida em uma família indiana e tenta conciliar essas duas influências, duas formas distintas de ser mulher e de estar no mundo. Culpa-se pelo desgosto causado aos pais ao abandonar a faculdade de direito, mas está determinada a descobrir seu próprio caminho. Inesperadamente, ele a leva a dar aulas de inglês para mulheres punjabi – aulas que logo se transformam em confidências de fantasias eróticas. Nikki se vê envolvida pela comunidade e interessada nos segredos que ela guarda, que incluem até mortes de moças punjabi.

O livro segue uma fórmula, mas faz isso de forma eficiente. É muito bem escrito, a história e os personagens cativam. Vi-me interessada em Nikki e nas demais mulheres, fiquei curiosa pela cultura punjabi e fascinada pelas misturas e colidências. Dá para dizer que, para Nikki, a cultura britânica triunfa (o que pode ser alvo de críticas dos mais ciosos), mas ela sai diferente do outro lado, influenciada, amadurecida e bem resolvida.

A própria autora é o resultado da mistura de influências punjabi e dos diversos países onde viveu durante a infância e juventude, o que para mim torna o livro ainda mais interessante. Um dos melhores do ano em que assinei a Tag Inéditos.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

Nova Iorque 2140

Livro da vez: “Nova Iorque 2140”, de Kim Stanley Robinson. Leitura de fevereiro do projeto #lendoscifi, organizado pela @soterradaporlivros.

Finalmente a catástrofe ambiental aconteceu: as cidades a beira-mar foram alagadas devido ao derretimento das calotas polares, a humanidade enfrenta uma terrível escassez e os animais entraram em extinção em uma velocidade nunca antes vista. Nova Iorque foi duramente atingida e o meio de transporte principal da cidade agora é o barco. Apesar disso, milhões ainda moram na cidade, o preço do metro quadrado é mais extorsivo do que nunca e o abismo entre pobres e ricos só aumenta.

O livro nos apresenta os moradores do MetLife, transformado numa mini-cidade com milhares de habitantes, uma horta e até um andar dedicado à criação de animais. Vlade é o supervisor do prédio, Charlotte é membro da cooperativa de moradores, Gen é inspetora de polícia, Amelia é uma celebridade da nuvem (o futuro da internet), Franklin trabalha no mercado de capitais etc. etc. etc. Personagens não faltam, e a eles deve ser somada a própria cidade. Ah, ainda tem o irônico Cidadão, que entre um capítulo e outro explica ao leitor como o mundo se tornou um caos ainda maior do que o atual.

As subtramas da história são excessivas, nem todas são bem amarradas e algumas são francamente desnecessárias. Apesar disso, achei uma leitura excelente e me envolvi com os personagens, amando uns, odiando outros e vivendo na velha nova Manhattan por alguns dias. Não é um livro fácil, não dá pra ler rapidinho. Exige paciência do leitor, mas senti que minha paciência foi mais que recompensada. Seria bacana ver uma série baseada no livro.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas