Uma Pálida Visão dos Montes

Uma Pálida Visão dos Montes - capaUma Pálida Visão dos Montes é o primeiro romance de Kazuo Ishiguro, japonês nascido em Nagasaki e criado na Inglaterra, autor de um dos meus livros favoritos, Não me abandone jamais. Nesse primeiro texto, já dá pra ver o potencial do escritor para criar dramas sem apelar para cores fortes. Ele economiza nos adjetivos, escolhe a dedo cada palavra e faz uma prosa contida, contemplativa e quase lírica, cuja delicadeza joga um véu sobre a tragédia que narra.

O livro é feito das reminiscências de uma sobrevivente de Nagasaki há muitos anos radicada na Inglaterra. Etsuko recorda o verão em Nagasaki em que estava grávida de sua primeira filha e conheceu Sachiko, uma vizinha que foi sua amiga por alguns meses. Sachiko tivera a vida arruinada pela Segunda Guerra Mundial e fazia o que podia para criar sua filha Mariko, enquanto mantinha as esperanças numa futura mudança para os Estados Unidos. De vez em quando, a história se volta para o presente de Etsuko e indica que sua própria mudança para a Inglaterra não transformou sua vida no mar de rosas com que Sachiko sonhava.

Ishiguro faz os dias parecerem cotidianos na Nagasaki pós-bomba atômica, ao mesmo tempo em que revela as feridas causadas pelo ataque: as mudanças de rumo, de vidas, de paisagem, de perspectivas. O autor faz as vidas de seus protagonistas parecerem até banais na maior parte do tempo – então, pontua algum detalhe que dá a verdadeira dimensão do drama em que vivem. Esse talento narrativo faz o leitor se envolver com a história quase sem perceber.

Uma Pálida Visão dos Montes não é brilhante como Não me abandone jamais, mas dá uma boa ideia do que Ishiguro ainda iria produzir.

Atualização: esse livro guarda interpretações que apenas um leitor muito atento – ou um que faça uma segunda leitura – apreenderá (o Sr. Monte precisou me alertar sobre a mais importante delas). Se entender inglês e não se importar com “spoilers” (ou já tiver lido o livro), há um trabalho muito interessante sobre Uma Pálida Visão dos Montes.

Ficha

2 comentários on “Uma Pálida Visão dos Montes

  1. Fiquei curiosa com “Não me abandone jamais” porque segui o link na postagem e vi a sua resenha que fala que ele é ótimo mas não conta nada sobre a trama em si. E vocÊ recomendou não ler resenhas nem nada (nem mesmo a orelha) mas sim lê-lo sem nem saber do que se trata. Quer teaser maior que esse? Vou colocar na minha lista de leituras futuras e, se gostar dele, Talvez leia Uma pálida visão dos montes. Beijo!

  2. @Marina, eu tenho a maior dificuldade em dar resumo de “Não me abandone jamais”, mas é mais ou menos isso: a gente acompanha a rotina de um internato no interior da Inglaterra. As crianças fazem todas as atividades esperadas de um internato, os professores são rígidos etc. Mas algo não é dito, buracos ficam faltando, e de vez em quando o comentário de um professor chama a atenção… Um exemplo: essas crianças nunca vão para a casa dos pais nas férias.

    Se eu disser mais que isso, estrago o livro. 🙂

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