500 Anos de Sabor

No colégio, História era minha matéria favorita. No dia-a-dia, o interesse por comida (e por comer, obviamente) é constante. Claro que um livro juntando essas duas delícias chamaria minha atenção. Apesar disso, Brasil 1500/2000: 500 Anos de Sabor mofou na minha estante por anos (talvez desde 2000, de fato). Eu não sabia o que estava perdendo.

O livro é um verdadeiro passeio pela história gastronômica do Brasil. Da Colônia até os dias atuais, passando pelas contribuições dos índios, dos negros e das várias correntes migratórias, 500 Anos de Sabor é uma leitura fascinante, nada diet e capaz de agradar até quem não curte esquentar a barriga no fogão ou ler sobre batalhas, datas e figuras históricas. Afinal, todo mundo gosta de uma boa mesa (aliás, eis aí um bom jeito de motivar o estudo da História).

Conta-se, por exemplo, que a onipresente mandioca veio dos índios (ao passo que sua bebida preferida, o cauim, não caiu nas graças dos europeus – felizmente); que a mesa portuguesa só ganhou sabor de verdade com os temperos trazidos pelos negros em honra aos seus orixás; que entradas e bandeiras enriqueceram a culinária nacional com pratos rápidos e de fácil conservação, como a paçoca de carne-seca; que as Grandes Guerras, assolando a Europa, fizeram os olhos e o paladar brasileiros voltarem-se para os vizinhos norte-americanos.

A discussão sobre a origem da feijoada também está presente, claro:

Feijoada
Quem resiste?

Como toda paixão, a feijoada costuma gerar acaloradas polêmicas. Teria mesmo nascido na senzala? Não teria muito mais a ver com receitas portuguesas mesmo, das regiões da Estremadura, do Alto Douro e Trás-os-Montes, que misturam feijão de vários tipos, menos o feijão preto, a linguiças, orelhas e pés de porco, e que se recomenda comer com arroz, especialmente na terça-feira de carnaval? Não seria uma receita muito mais moderna, surgida ali pelo final do século passado [XIX], a partir de informações culinárias de outros países, já então mais frequentes no Brasil, inspiradas por outros cozidos, como o cassoulet francês, que também leva feijão – branco – no seu preparo?

(…)

O que se pode fazer com segurança, para chegar mais perto da verdade, é relembrar um pouco os hábitos alimentares da senzala brasileira, nos dois primeiros séculos de colonização. (…)

Quando a escassez de comida não era tanta, suas refeições básicas juntavam a onipresente farinha de mandioca à carne ou peixe, além dos vegetais que estivessem à mão. E quando podiam, os escravos procuravam manter sua alimentação de origem, que não prescindia do feijão preto, trazido por eles da África, mais muita pimenta-malagueta como tempero. Dos senhores de engenho recebiam às vezes restos de carnes, mais a permissão para entrar nos pomares, servindo-se das frutas disponíveis, entre elas a laranja. E a aguardente costumava ser distribuída até com fartura, menos por generosidade e mais para estimular a alegria, aumentando assim, quem sabe, o empenho na lida dos canaviais.

Feijão preto, restos de carnes, farinha de mandioca, pimenta, laranja, até a bebida – não é difícil reconhecer na união desses elementos um parentesco bem próximo com a nossa feijoada contemporânea. (…) Não deve ser mera coincidência.

Às margens do texto, poesia, prosa, ditos populares e canções ilustram a fusão entre culinária e cultura.

500 Anos de Sabor foi patrocinado pelo Pão de Açúcar em 2000 e não é mais vendido; quase nem escrevo sobre ele.  O Neto Cury (que me lembrou dos sebos), a Cynthia Semíramis (que falou sobre a preservação da memória do livro) e a Júlia Reis (que nem sabia que o livro tinha a ver com a praia dela) disseram que isso não é razão suficiente pra não falar dele. Estão certos. O texto é bacana, as receitas (mais de duzentas) vão da maniçoba à charlotte russe e, veja só, dá pra comprá-lo na Estante Virtual, meu sebo favorito.

Ficha Técnica

  • Título: 500 Anos de Sabor – Brasil 1500-2000
  • Autora: Eda Romio
  • Ano de edição: 2000
  • Editora: ER comunicações
  • Páginas: 248
  • Encontre na Estante Virtual.

A Conversa Chegou à Cozinha de quem?

Já está passando da hora de dizer quem ganhou os livros A Conversa Chegou à Cozinha e O Mundo É O Que Você Come. Afinal, a promoção encerrou-se no dia 20 de março.

Foram poucas, mas belas participações. Renderam-me viagens no tempo e água na boca.

Agora, sem mais delongas…

A Conversa Chegou À Cozinha da Gabi Bianco!

O texto da Gabi foi o mais inspirador pra mim. Não só porque sou uma descendente de italianos apaixonada por massas, mas porque macarrão ao molho de tomate é um dos pratos favoritos da minha mãe.

A todos os participantes, muito obrigada! Espero que tenham gostado de fazer os textos como gostei de os ler.

Gabi, o pessoal da editora vai entrar em contato contigo e mandar os livros para a sua casa logo, logo. 🙂

Como Ser Legal

Como Ser Legal

Li Alta Fidelidade há alguns anos e ele entrou fácil na minha lista de Top 5. Não é à toa que passei a correr atrás dos outros livros do Nick Hornby. Como Ser Legal é o segundo que leio e, embora não seja tão formidável quanto Alta Fidelidade, traz uma história muito bem contada.

Já de início, chama a atenção a escolha de uma mulher como personagem narradora. Nick Hornby foi tão bem-sucedido descrevendo relacionamentos do ponto de vista masculino… será que conseguiria o mesmo do lado oposto? A resposta é sim, ele conseguiu. Captou, inclusive, a facilidade das mulheres para elocubrações, em contraponto à secura (objetividade?) masculina.

Se bem que, lá pelas tantas, a coisa muda de figura – não por inabilidade do autor, mas por exigência mesmo da história. Kate passa a ser a metade objetiva do casamento, cabendo a David alimentar delírios, rompantes messiânicos e uma incrível esperança no ser humano.

Enquanto David, acompanhado de seu recém-descoberto guru Boas Novas e de sua filha de oito anos, faz planos para salvar o mundo (e parte para a prática), Katie, médica competente e mãe dedicada, começa a se perguntar o que é ser legal, de fato. Ela, que se achava tão contribuidora para o bem da sociedade, passa a rever seus conceitos e comportamentos, buscando descobrir o que é ser, realmente, uma boa pessoa.

Nesse ponto, o livro resvala perigosamente numa filosofia pretensiosa, mas recupera-se a tempo. O humor do texto, o cinismo dos personagens e as tentativas inusitadas de David para salvar o mundo mantêm a história num tom casual e pra lá de divertido.

Pinceladas

Falhei com minha filha. Molly só tem oito anos de idade, e anda triste… Eu não queria isso. Quando ela nasceu, eu tinha certeza de que poderia evitar isso, e não consegui. Percebo que a tarefa que assumi era irrealista e irrealizável, mas isso não faz diferença: acabei contribuindo para a criação de mais um ser humano confuso e assustado. (p. 144)

Casar e criar uma família é como emigrar. Eu vivia no mesmo país que meu irmão, e compartilhava os valores, gostos e atitudes dele; depois fui embora. Apesar de não notar, comecei a falar com um sotaque diferente e a pensar de forma diferente. Embora recordasse minha terra natal afetuosamente, já perdera todas as características dela. Atualmente, porém, quero voltar para casa. Vejo que cometi um grande erro, que o novo mundo não é aquilo que se supõe e que as pessoas de lá são muito mais saudáveis e sábias do que as pessoas que vivem no país que eu adotei. Quero que meu irmão me leve com ele. Nós podíamos ir para a casa da mamãe e do papai. Seríamos mais felizes lá. Mark não era um suicida quando morava lá, e eu não era cheia de preocupações e culpas. Seria ótimo. Provavelmente brigaríamos para escolher os programas de televisão, mas fora isso… E não cometeríamos os erros de antes. Não resolveríamos que queríamos crescer e viver vidas próprias. Já tentamos isso e não deu certo. (p. 247-248)

Ficha Técnica

  • Título: Como Ser Legal
  • Título Original: How To Be Good
  • Autor: Nick Hornby
  • Editora: Rocco
  • Páginas: 307
  • Cotação: 4 estrelas
  • Pesquise o preço de Como Ser Legal.

A Conversa Chegou À Cozinha

A Resenha

Ninguém lê um livro de receitas de cabo a rabo, certo? Seria como ler um dicionário, não é mesmo?

Não!

A Conversa Chegou À Cozinha
A Conversa Chegou À Cozinha

Tudo depende do livro, na verdade. Semana pasada caiu-me nas mãos um tão gostoso (sem trocadilhos) que vale a pena ler de ponta a ponta: é A Conversa Chegou À Cozinha, da Rita Lobo, criadora do site Panelinha e blogueira.

O livro tem dois diferenciais muito bacanas.

O primeiro deles é que cada bloco de receitas é precedido por uma crônica, um texto escrito originalmente para o blog da autora. Além de abrirem o apetite, os textos são divertidos e bem escritos.

O segundo diferencial é a variedade de receitas, mais que a quantidade delas. Na verdade, são apenas quarenta e poucas, mas que cobrem um vasto cardápio. Tem receita de coquetel, de comida vegetariana, de bolo de chocolate, receita para uma só pessoa (perfeita pra quem não cozinha só pra não ter que lavar a louça), pra doze de uma vez e por aí afora. Algumas são simplérrimas, outras exigem mais trabalho, mas todas são explicadas nos mínimos detalhes, do jeito que eu gosto.

As crônicas e as receitas já foram devidamente devoradas com os olhos. Falta-me agora, organizar minha rotina (não é à toa que o DdF está às moscas) e voltar a cozinhar, pra testar os pratos e devorá-los no sentido literal da coisa.

Ficha Técnica

  • Título: A Conversa Chegou À Cozinha
  • Autora: Rita Lobo
  • Primeira edição: 2008
  • Editora: Ediouro
  • Páginas: 207
  • Cotação: bah, sem testar as receitas? Complicado. Pelas crônicas, 4 estrelas fácil.
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A Promoção

Quer ganhar um exemplar do A Conversa Chegou à Cozinha? É tão simples quanto fazer arroz: escreva um post no seu blog dedicado a uma comida especial para você. Uma que traga lembranças de infância, ou que relembre um episódio com os filhos, ou remeta a uma recordação de viagem.

Faça um trackback para este artigo, ou deixe um comentário com o link para o seu post (sem isso, não há como anotar sua participação).

O texto mais bacana leva A Conversa Chegou À Cozinha e, de quebra, ganha também o livro O Mundo É O Que Você Come.

Você tem até o dia 20 de março para entrar na roda!