Cazuza – O Tempo Não Pára

Ficha técnica

Brasil, 2004. Drama. 100 min. Direção: Sandra Werneck e Walter Carvalho. Com Daniel de Oliveira, Marieta Severo e Reginaldo Faria.

O filme acompanha a vida de Cazuza (1958-1990), desde o início de sua carreira, quando ele cantava em inglês no Circo Voador, e seu relacionamento com os pais e os amigos.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

4 estrelas

Nunca fui tiete do Cazuza ou do Barão Vermelho, mas sempre curti as músicas, tenho um CD (coletânea), gosto quando toca alguma coisa na rádio. Lembro-me bem das últimas imagens do Cazuza, fraco, debilitado. Lembro o tanto que o desamparo dele me comoveu e, ao mesmo tempo, assustou. Em 1990, eu tinha onze anos, pouca coisa mais velha que a AIDS, da qual pouco se falava, ainda. Dizia-se que era uma doença cruel, mortal e que castigava os gays e os drogados. Sim, eram esses os termos. Não em casa, mas o que eu ouvia na rua passava sempre por aí. A AIDS era um castigo, uma maldição.

Com onze anos, ainda não compreendia a carga de preconceito por trás disso, mas entendia a face da morte apresentada pela AIDS e a dor que ela provocava. Gravou-se na minha memória a imagem do Cazuza como símbolo dessa dor toda. Fui ver o filme já esperando pela dose de sofrimento que, inevitavelmente, ele teria de mostrar. Uma história sem final feliz.

No entanto, Cazuza – O Tempo Não Pára não é um tributo à morte, mas uma ode à vida. O filme apresenta um garoto elétrico, um tanto rebelde, mas também um ser humano doce e sincero. Acima de tudo, fiel a si próprio. Alguém que viveu intensamente, loucamente, sim. Que teve defeitos, virtudes, amigos, amores, aventuras. Compôs grandes canções, fez sucesso, tornou-se o líder de uma das grandes bandas dos anos 80. Cresceu, mas permaneceu menino. Desesperou, mas contou com família e amigos para apoiá-lo. Sofreu, mas teve garra e não desistiu. Vida breve, mas aproveitada, sem dúvida.

O Daniel de Oliveira dá um banho de interpretação e, ao lado da excelente Marieta Severo, diverte e emociona o público. Dá bem para imaginar toda a preocupação que o Cazuza deu à mãe, mesmo assim sempre doce, amorosa, presente. Orgulhosa do filho que tinha, nunca envergonhada.

Vergonhoso foi um comentário cínico ouvido à saída da sessão (não por mim, mas por uma companheira de filme): “Se tivesse usado camisinha, isso não tinha acontecido”. Tem gente que não merece essa classificação, mesmo.

Eu me segurei para não abrir o berreiro nas cenas finais. Ainda assim, algumas lágrimas teimosas caíram.

O filme conta com um elenco de primeira, muito carismático, e um ritmo ágil, incapaz de entediar. Tem cenas feitas para chocar, o que é ótimo. Só desta forma, sem meias palavras, pode-se diminuir a hipocrisia e o preconceito. Se as pessoas devem ser julgadas, que o sejam pelo seu caráter, pela bondade ou maldade que exalam, não por suas preferências sexuais.

Mais um aspecto interessante é a tumultuada relação entre o incontrolável Cazuza e o perfeccionista Frejat, com direito a alguns momentos muito engraçados.

O Outro Lado da Rua

Ficha técnica

Brasil, 2004. Drama. 97 min. Direção: Marcos Bernstein. Com Fernanda Montenegro, Raul Cortez e Laura Cardoso.

Mulher solitária de 65 anos vigia prédios vizinhos de Copacabana com seu binóculo e acredita ter visto um homem aplicar uma injeção letal na mulher. Por conta própria, ela resolve segui-lo e eles acabam se envolvendo.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

3 estrelas

Tinha uma idéia completamente diferente do filme. Pelo trailer, esperava algo como um policial, ou um filme de suspense. No fundo, é quase um filme de amor. Um romance que aproveita para questionar a forma como vemos o mundo. Tudo é realmente como vemos? Extrapolando um pouco: nossos valores são os “melhores”? De quebra, discute a velhice.

A propósito, tenho um certo pânico de envelhecer. Mas, se for pra ficar como a Fernanda Montenegro (capaz, lúcida e bonita aos 75 anos), até que não reclamaria, não.

Os pontos altos  de O Outro Lado da Rua são as grandes interpretações de Fernanda Montenegro e Raul Cortez e os excelentes diálogos. Queria colocar um deles aqui, mas demorei demais para escrever e agora só me lembro de fragmentos.

Diários de Motocicleta

Ficha técnica

The Motorcycle Diaries. Peru/Chile/Inglaterra/Argentina/Brasil, 2004. Drama. 124 min. Direção: Walter Salles. Com Gael García Bernal, Rodrigo de la Serna e Mía Maestro.

O filme acompanha a viagem pela América do Sul do estudante de medicina Ernesto Guevara e do bioquímico Alberto Granado, que, em 1952, cruzaram o continente com uma moto. Do mesmo diretor de Central do Brasil e Abril Despedaçado.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

3 estrelas

Estava com o pé atrás quanto ao filme. Receava deparar-me com uma produção de índole doutrinadora, catequizadora. Felizmente, não é esse o foco principal da história.

A primeira metade de Diários de Motocicleta é plena de momentos cômicos. Impossível não rir diante das situações inusitadas em que se metem os protagonistas, várias delas causadas pela motocicleta, ironicamente batizada de “La Poderosa”. Na segunda metade, o roteiro recebe cores mais carregadas, mais trágicas e comoventes. A realidade de pobreza e abandono da América Latina é destacada. Ernesto Guevara começa a questionar uma série de coisas e leva consigo, nesse questionamento, o espectador.

É interessante comparar o Ernesto do início do filme com o de seu encerramento. O moleque ingênuo, honesto demais e absolutamente crente no mundo cresce muito nos seis meses durante os quais se desenrola a história. Adquire malícia, graças ao seu companheiro de viagem e às situações em que se vê metido. Principalmente, desenvolve um olhar crítico aguçado, que o faz dar novo rumo à sua vida. Essa é a parte da história que poderia ser chamada de “catequética”, porque tem o claro intuito de levar o espectador também à reflexão. Mais do que um discurso sobre política ou regime, no entanto, o que se vê é um questionamento sobre condições sociais e valores humanos, numa busca pelo rompimento de barreiras que não têm nenhuma outra razão de existir, a não ser a meramente “psicológica”.

Ponto alto: a belíssima fotografia (não, não vou comentar sobre o Gael, não o achei isso tudo).

Ponto fraco: poderia durar uns quinze minutos a menos.

Diários de Motocicleta ganhou o Oscar de Melhor Canção Original em 2005, pela lindíssima Al Otro Lado del Río, do uruguaio Jorge Drexler, primeira canção em espanhol a ser indicada ao prêmio (vale a pena procurar a trilha sonora do filme). A produção da festa, no entanto, não permitiu que ele cantasse a música na premiação, conferindo sua interpretação a Antonio Banderas. Drexler não se fez de rogado: ao receber a estatueta, cantou um trecho de sua música e terminou com um “Obrigado”.

Em tempo: não saia antes dos créditos finais, quando são exibidas fotos da viagem.

Benjamim

Ficha técnica

Brasil, 2004. Drama. 100 min. Direção: Monique Gardenberg. Com Paulo José, Cleo Pires e Dalton Mello.

Homem encontra uma jovem que o faz lembrar de um romance turbulento, vivido na época da ditadura. Baseado em livro homônimo de Chico Buarque. Da mesma diretora de Jenipapo.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

3 estrelas

Fui ver o filme motivada pela atuação da Cleo Pires, que foi premiada no exterior pelo trabalho em Benjamim. Realmente, ela está ótima. É um papel difícil, denso. Ela se saiu muito bem. A atuação do Paulo José é outro ponto forte.

A história não agradou muita gente. Benjamim não segue uma linearidade temporal e, por vezes, fica confuso. Este é o estilo de escrita do Chico Buarque. Quem já leu algum dos livros dele sabe que, de vez em quando, perde-se o fio da meada, para reencontrá-lo páginas à frente. Isso exige do leitor uma atenção constante, atenção que tem de ser ainda maior no cinema, já que não se pode simplesmente voltar a fita e rever o que ficou nebuloso.

Nunca tinha visto um filme dessa diretora. Ela fez um bom trabalho, retratando as idas e vindas da história e reunindo um elenco de primeira.

Um bom entretenimento, um filme bem construído, um desfecho marcante.