Oscar 2007

Chegará o ano em que a festa do Oscar será uma minissérie em quatro ou cinco capítulos, televisionada ao longo da semana. A 79ª edição da premiação atingiu a impressionante duração de quatro horas e vinte minutos – sem contar a tansmissão da passagem das celebridades pelo tapete vermelho. Quem aguenta? Eu aguentei, mas a duras penas. A Academia premiou alguns dos meus filmes favoritos, o que compensou o esforço. Vamos aos destaques.

Babel, um dos filmes mais badalados do ano, com sete indicações, levou apenas o Oscar de melhor trilha sonora. Merecidíssimo, sem dúvida, porque se trata daquele tipo de filme em que a trilha é personagem principal, respondendo por momentos de forte apelo.

Dreamgirls, o recordista de indicações (oito, três delas na categoria de melhor canção original) saiu com somente dois prêmios: melhor atriz coadjuvante (a excelente cantora e boa atriz Jennifer Hudson, gongada na terceira temporada de American Idol, aparentemente sem motivo) e melhor mixagem de som. Não merecia nem mais, nem menos. É um bom musical, mas não se justifica todo o barulho feito em torno dele.

A estatueta de melhor canção original foi, surpreendentemente (mas com mérito), para I need to wake up, de Melissa Etheridge, feita para a seqüência final de Uma Verdade Inconveniente. A belíssima canção pode ser ouvida no youtube.

Aliás, o filme de Al Gore sobre o aquecimento global levou, também, o Oscar de melhor documentário em longa-metragem, para minha felicidade. Quem sabe agora volte às telas dos cinemas brasileiros e, ainda, faça sucesso nas locadoras quando o dvd chegar por aqui.

Helen Mirren, absolutamente convincente no papel da Rainha Elizabeth II, confirmou o favoritismo e ganhou o prêmio de melhor atriz pelo filme A Rainha. Esbanjou elegância ao recebê-lo.

Sherry Lansing no tapete vermelho do Oscar 2007Falando em elegância, ela foi uma constante entre os que passaram pelo palco do Oscar. Destaque para os belos vestidos de Kate Winslet, Cate Blanchett e, especialmente, Sherry Lansing (foto à direita), homenageada com o prêmio de benemerência Jean Hersholt. Você pode ver as roupas das outras estrelas no site do Oscar.

O adorável Pequena Miss Sunshine levou para casa as premiações de melhor ator coadjuvante (Alan Arkin, no papel do avô viciado em heroína) e melhor roteiro original – nada mais justo diante de uma excelente história recusada por todas as grandes produtoras (ahá, bem-feito para elas!) e que só saiu do papel graças à perseverança de seu autor, Michael Arndt.

Piratas do Caribe – O Baú da Morte, divertidíssimo como o anterior e concorrente em quatro categorias, ganhou a estatueta de efeitos especiais graças à incrível fusão entre cenas reais e computação gráfica.

Para fechar a noite com chave de ouro, Martin Scorsese finalmente foi reconhecido com o Oscar de melhor diretor – e aplaudido de pé pelos colegas – pelo excelente Os Infiltrados, que também foi premiado como melhor filme do ano. Nada mais justo, embora, diga-se de passagem, seus demais concorrentes também estivessem à altura da estatueta.

Uma cerimônia de grandes filmes, algumas surpresas e premiações merecidas. Também excelentes as diversas montagens com cenas de filmes de todos os tempos, numa verdadeira viagem pela história do cinema, e belíssimas as encenações de imagens significativas dos principais concorrentes, feitas por bailarinos por trás de uma tela branca, num gracioso jogo de movimento, luz e sombra.

Só faltou ser menos cansativa. E não, desta vez não vou comentar sobre a péssima tradução simultânea de Rubens Ewald Filho.

Referências

E teve a peça sobre o Renato Russo

A montagem chama-se simplesmente Renato Russo. O ator Bruce Gomlevsky representa o cantor e compositor num monólogo de duas horas. Ilustra as várias fases da vida do Renato, canta algumas das suas mais famosas composições e emociona a platéia com uma interpretação memorável.

Sou fã de carteirinha do Renato Russo e da Legião Urbana. Fiquei doida pra ver a peça assim que soube da sua temporada em Brasília, mas desisti quando descobri a loucura que era conseguir um ingresso: só quem se dispunha a ficar seis, oito, dez horas na fila da bilheteria saía com o cobiçado prêmio. A temporada no Centro Cultural Banco do Brasil nem foi tão curta, para os padrões do CCBB. Só que um mês e meio de espetáculo numa cidade que idolatra o Renato foi absolutamente insuficiente. Acabei desencanando, na esperança de que a peça voltasse a Brasília depois de alguns meses.

Então, no sábado de manhã, me liga a Ciléia com a mais inesperada notícia: depois de ter ficado cinco horas na fila para conseguir dois convites, o acompanhante desistiu em cima da hora, e o ingresso estava disponível! Dá pra acreditar na minha sorte?! Dá pra imaginar o tanto que pulei de alegria?!

Ainda mal acreditando, vi-me na mesma noite diante de um ator excepcional, numa caracterização muito competente e, acima de tudo, emocionada do Renato. Tá que nos primeiros dez minutos bate a frustração: “Ah, não é o Renato…”. Claro que não é, ora bolas – afinal, é uma peça teatral, não uma sessão espírita.

A decepção irracional dissipa-se rapidamente, graças ao carisma de Gomlevsky e à qualidade da produção. A iluminação é um show à parte, o uso bem bolado de um telão para exibir imagens ligadas à vida do cantor enriquece a apresentação e a banda que acompanha o ator ao vivo (chamada Arte Profana e, no palco, referida como 42th Street Band, banda imaginária criada por Renato durante a adolescência) contribui para dar um clima realista à peça.

Longe de retratar Renato como herói de uma geração, posição que ele sempre recusou, Bruce Gomlevsky mergulha nas dores, fraquezas e inseguranças do ídolo, trazendo à tona uma figura frágil e imperfeita de um lado, sensível e carismática de outro. Foi graças a essa fusão de luz e sombra que Renato Russo criou letras memoráveis, críticas à sociedade, à juventude e ao Brasil, hinos de milhares, retratos de momentos pessoais e, ao mesmo tempo, universais.

São duas horas que passam voando. No fim, resta com a sensação de ter (quase) visto o Renato Russo ao vivo e a cores. Para quem, como eu, jamais assistiu a um show da Legião, já é um grande consolo.

A peça segue temporada pelo Brasil. Pesquise a programação cultural da sua cidade e, se tiver a chance de vê-la, não a deixe passar. Se retornar a Brasília, assistirei novamente.

Ci, mais uma vez, obrigadíssima!

Mais Estranho que a Ficção

Ficha Técnica

Stranger than Fiction. EUA, 2006. Comédia. 113 minutos. Direção: Marc Forster. Com Will Ferrell, Tony Hale, Maggie Gyllenhaal, Emma Thompson, Queen Latifah, Dustin Hoffman.

Certa manhã, Harold Crick (Will Ferrell), um funcionário da Receita Federal, passa a ouvir seus pensamentos como se fossem narrados por uma voz feminina (de Emma Thompson). A voz narra não apenas suas idéias, mas também seus sentimentos e atos com grande precisão. Apenas Harold consegue ouvir esta voz, o que o faz ficar agoniado. Esta sensação aumenta ainda mais quando descobre pela voz que está prestes a morrer, o que o faz desesperadamente tentar descobrir quem está falando em sua cabeça e como impedir sua própria morte.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

2,5 estrelas

Filme do mesmo diretor de Em Busca da Terra do Nunca, excelente produção de 2004. Infelizmente, Mais Estranho que a Ficção não manteve a excelência, apesar de seu elenco de estrelas. Emma Thompson – sem maquiagem e perfeita no papel de escritora atormentada – e Dustin Hoffman – um tanto sub-aproveitado – não são suficientes para conferir dinamismo a um roteiro pretensioso, que não entrega o que promete.

A idéia que impulsiona a história – a discussão sobre o ato de escrever um romance, numa espécie de metalinguagem – sequer é original. Tema semelhante (especificamente, o processo de escrever um roteiro para cinema) foi explorado em Adaptação, do fantástico Charlie Kaufman. Mais Estranho que a Ficção também incorpora um pouco de O Show de Truman (sensação de perda do controle sobre a própria vida) e de Quero ser John Malkovich (tem gente na minha cabeça!),outro filme imperdível de Kaufman. Não é à toa que, como me disse um amigo, tem gente definindo o filme como “um Kaufman para quem não entende Kaufman”.

Só que é simples assim: se você quer ver surrealismo com tensão bem colocada e generosas doses de humor negro – drama e comédia ao mesmo tempo e na medida certa -, não aceite imitações: só Kaufman é original.

Em Mais Estranho que a Ficção, falta, além de criatividade, ritmo. O filme é tão irremediavelmente lento que nem mesmo a vivaz personagem de Maggie Gyllenhaal consegue animá-lo, embora a ela sejam devidos bons momentos poéticos.

A história ainda poderia ser salva por um desfecho incomum, mas nem no último momento o filme se recupera. O espectador é levado a ansiar pelo final perfeito, apenas para ver-se frustrado.

Um dos diálogos finais vem sob medida para definir o filme:

– It’s ok.
– But not great?
– No; it’s ok.

Esse trecho, dito no contexto do filme e referindo-se ao seu elemento principal, ao lado da cena em que Harold afirma ter gostado especialmente de uma determinada parte da história – que é, de fato, uma das melhores -, são as grandes piadas do filme sobre si próprio. Essa brincadeira seria interessante, se fosse honesta. Não é o caso aqui. Mais Estranho que a Ficção, longe de ser um roteiro que confortavelmente ri de si mesmo, propõe-se a ser uma história cult, “cabeça”, inteligente. Se não tivesse tantas aspirações, seria divertido. Como as tem, é apenas medíocre.

Indicados ao Oscar 2007

Hora de comentar rapidamente as indicações ao prêmio mais badalado da indústria cinematográfica.

O recordista foi Dreamgirls: oito indicações, sendo três na categoria de melhor canção original. Ultrapassou Babel, fracasso de público nos Estados Unidos e sucesso de crítica, que recebeu sete menções. Duas atrizes de Babel concorrem à estatueta de melhor atriz coadjuvante. Isso é raro (nem sei se já aconteceu) e, de certa forma, prejudica as chances de o filme levar o Oscar da categoria, já que os votos acabam se dividindo entre as duas concorrentes.

Brilhante (e esperada) a indicação de Uma Verdade Inconveniente ao Oscar de melhor documentário em longa-metragem. Mesmo que não ganhe, a indicação já dá mais visibilidade ao filme. É possível que volte às telonas no Brasil. Tomara que seja bem divulgado, desta vez, e atinja um público maior. A causa é boa e precisa ser difundida.

Pequena Miss Sunshine compete em quatro categorias, merecidamente. Abigail Breslin, que interpretou a adorável menininha do filme, foi indicada como melhor atriz coadjuvante.

A consagrada Meryl Streep, que há alguns dias levou o Globo de Ouro 2007 de melhor atriz pelo papel em O Diabo Veste Prada, concorre agora ao Oscar.

Os Infiltrados, filme fantástico, teve cinco indicações. Será que Scorsese finalmente ganhará o reconhecimento da Academia?

O Grande Truque ficou com duas indicações, ambas técnicas: melhor fotografia e melhor direção de arte.

A grande surpresa, para mim e para o resto do mundo, foi a ausência de Volver entre os indicados a melhor filme estrangeiro. A Academia deve ter pensado “Ah, esse Almodóvar vive concorrendo, faz filmes bons direto, vamos dar chance a outras produções”. Tudo bem, mas Volver é um dos melhores filmes do diretor espanhol, senão o melhor (dos que já vi, é meu preferido). A indicação era dada como certa.

O link para a lista completa de indicados está aí embaixo. Agora, é correr para assistir aos favoritos antes da premiação, o que a torna sempre bem mais interessante. Temos até 25 de fevereiro.

Referência

Lista dos indicados ao Oscar 2007