Sobre o direito de protestar.

Texto publicado originalmente na minha conta no facebook,
durante o jogo do Brasil, em 15 de junho de 2013.

Reclamam de protesto nas ruas porque atrapalha o trânsito.

Reclamam de vaias – uma das mais pacíficas e inofensivas formas de manifestação do pensamento coletivo jamais imaginadas – porque é… falta de educação.

Não. Vaiar é exercício democrático. Falta de educação é outra coisa.

Vivemos, teoricamente, num regime democrático. Espera-se que as pessoas tenham o direito de exprimir o que pensam. Entendo que isso não é conveniente para vários partidos e para a maioria dos políticos, mas, quando vejo membros da sociedade civil se queixando, começo a me preocupar.

A alternativa à democracia é a ditadura. É isso que deseja quem reclama? Não acredito que seja, mas esse asco contra qualquer manifestação pública só pode ter como desfecho um regime ditatorial.

No começo de junho, ocorreram duas manifestações em Brasília que, na minha opinião, são horrendas: uma contra o direito ao aborto, outra contra o casamento homoafetivo. Ambas me ofendem profundamente, por inúmeras razões. Ambas me fazem ter vergonha desse país, que é cada vez menos laico. Mas ambas são legítimas. Por mais que eu execre esses protestos, por mais que eu seja contrária, tenho a obrigação de respeitar o direito dessas pessoas de se organizarem e irem pra rua gritando palavras de ordem (e, sim, atrapalhando o trânsito).

Esse é o jogo democrático. A democracia, com todos os seus problemas, ainda é o menos pior dos regimes. Você tem o direito de se ofender por uma manifestação pública – claro, estamos numa democracia! -, mas faz bem refletir sobre o que você pretende para si mesmo e para o Brasil. Se quer ter o direito de se expressar no futuro, é bom começar a analisar suas opiniões agora mesmo.

Faz parte da democracia ser contra as motivações ou bandeiras desse ou daquele protesto, mas é tremendamente perigoso ser contra o direito de protestar.

“Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.”
(fragmento de poesia de Eduardo Alves da Costa)

A Nota é Legal. Já as empresas…

Para ir direto à lista dos estabelecimentos que lançam a nota legal, clique aqui.

 

Desde 2008, temos no Distrito Federal a Nota Legal. O esquema é parecido com o de São Paulo (mas mais atrasado e trabalhoso): você solicita o cupom fiscal (ou a nota fiscal) ao vendedor, informa seu CPF e depois de alguns (muitos) meses o governo devolve na sua conta uma pequena (mesmo!) porcentagem do valor da compra, a título de retribuição por você ter bancado o fiscal tributária. Essa porcentagem é calculada em cima do ICMS recolhido pelo vendedor e varia segundo o tipo do estabelecimento. Você vai acumulando os créditos e, no ano seguinte, consegue desconto no IPTU ou no IPVA, à sua escolha.

Nota Legal

Não é nada, não é nada, este ano consegui cerca de 250 reais de desconto no IPVA, mesmo tendo pedido o lançamento do meu CPF no comprovante poucas vezes. Vai daí que este ano comecei a pedir quase sempre (às vezes me esqueço e não é sempre que o funcionário do estabelecimento oferece) e, além disso, passei a conferir no site do programa se a empresa fez o lançamento. Sim, porque você tem que pedir o cupom fiscal (no seu CPF) e a empresa tem que lançá-lo. E aí começa a “esperteza”: muitas empresas não fazem o lançamento do que venderam. Como muitos consumidores (a maioria deles) não reclamam, elas podem continuar sonegar o ICMS sem problemas (não estou dizendo que soneguem; mas o fato é que podem sonegar, já que ninguém reclama). E você, consumidor, fica sem o seu crédito no ano seguinte.

No site da Nota Legal, você pode registrar uma reclamação para cada compra não informada pelo lojista. Para isso, deve guardar o cupom fiscal e respeitar o prazo (a empresa tem 30 dias pra informar a compra; depois desse prazo, você tem 30 dias para informar o que a empresa não tiver lançado). Em alguns casos, essa sua reclamação é suficiente: a empresa apresenta o cupom fiscal que estava faltando e você recebe seus reaizinhos de desconto.

Só que, na maioria dos casos, a empres continua a não apresentar o cupom. Aí, você recebe um email da Secretaria de Fazenda do DF com um arquivo .pdf que traz os detalhes da sua reclamação e um prazo a ser observado. Dentro desse prazo, você deve se dirigir a uma Agência de Atendimento da Receita (os postos Na Hora não valem) com essa folha impressa + o cupom fiscal original + uma cópia desse mesmo cupom; você entrega essa papelada toda e aguarda a verificação da Receita, que manda outro email quando a reclamação for concluída.

Sim, é tudo muito chato. Sim, você tem que guardar os cupons fiscais por um longo tempo – agora, em novembro, a Receita ainda está cobrando os de junho. Os de abril pra trás, eu já tinha jogado fora. Se serve de consolo, o atendimento na agência é muito rápido (mas a da 513 Norte, onde vou, só abre meio-dia e meia – não sei as outras). Seria muito mais fácil se, como em São Paulo, pudéssemos enviar o cupom fiscal digitalizado por email. Quem sabe um dia?

Também seria muito mais fácil se as lojas obrigadas a participar do programa – desde dezembro de 2011, parece que todas são obrigadas – simplesmente cumprissem sua obrigação e apresentassem as benditas notas e cupons fiscais à Receita.

O que tenho feito é dar preferência aos lojistas que já sei que sempre cumprem todos os passos, sempre que possível. (Outra dica é consolidar as compras em um período curto do mês: assim você garante menos viagens à agência de atendimento.)

Para facilitar a minha vida, e porque isso pode ser útil pra você também, criei uma relação com os três tipos de estabelecimentos:

  • os que lançam os cupons fiscais sem que nenhuma ação da minha parte seja necessária;
  • os que o fazem apenas depois que registro a reclamação no site da Nota Legal;
  • os que só apresentam os cupons depois que vou à agência de atendimento.

Claro que essas informações estão baseadas na minha experiência de compra. Não posso afirmar que todas as filiais de uma rede tenham o mesmo comportamento (aliás, já percebi diferenças entre filiais), nem que todo consumidor terá o mesmo tratamento. (Posso, obviamente, comprovar tudo que eu estou falando em relação às minhas compras, já que o site da Receita mantém um registro exato de cada passo.)

Fato é que, se todos os consumidores reclamassem seus direitos, sejam de que natureza forem, as empresas agiriam de forma mais bacana. Não valeria tanto a pena burlar as regras.

Vale dizer que cabe um agradecimento especial à Carol Fraga, que foi a responsável por me colocar nessa rotina de conferência de cupons fiscais. 😉

Então, é isso. A página será atualizada uma vez por mês. Fique de olho!

(Ah, e não, não estou preocupada que o governo rastreie meus hábitos de consumo. Não tenho nada a esconder, não gasto mais do que ganho, não levo um padrão de vida incompatível com meu salário etc. etc. etc.)

Imagem: DAJ, royalty-free.

Peles, trabalho escravo e as nossas decisões de consumo.

Você deve se lembrar do escândalo envolvendo a Marisa e o uso de mão-de-obra escrava para a confecção das roupas que ela vende. Não existe almoço grátis: para as lojas de fast-fashion venderem barato, alguém está pagando caro com a própria saúde, a própria infância, a própria dignidade.

Ai, você poderia pensar que redes de fast-fashion que cobram um pouco muito mais por suas roupas têm uma linha de produção justa, mas a Zara já provou que não é bem assim.

Na onda da recente polêmica sobre o uso de peles por algumas blogueiras (o que me espanta de verdade é que isso seja uma questão polêmica), a Blogueira Shame listou várias marcas famosas, caras e badaladas que usam peles em suas roupas: Miele, M. Officer, Ellus, Shop 126, Daslu etc.

Aí, a gente pára e pensa: “cacilda, é impossível comprar uma mera peça de roupa sem ter uma crise de consciência?!”.

Olha, não é impossível, mas fica cada vez mais difícil, graças à enorme quantidade de informação a que temos acesso hoje em dia. A ignorância é uma bênção: era tão mais simples quando não sabíamos como os animais são cruelmente mortos para a confecção de casacos de pele, ou como crianças são exploradas pra você poder consumir as roupas da estação por um preço baratinho…

O lance, então, é sair por aí pelada?

Hum, a menos que você queira visitar a delegacia, essa não é uma boa ideia.

O lance mesmo é repensar o consumo e, principalmente, o consumismo. Você precisa comprar cinco novas peças de roupa toda semana? Ou duas? Ou uma?

Você precisa realmente seguir a última tendência pra ser feliz?

Você precisa de trocentos pares de sapatos e zilhões de produtos de maquiagem? Ou de um celular novo a cada seis meses?

A gente precisa consumir, claro. É impossível viver sem causar impacto ambiental (e, por favor, meio ambiente não é só floresta; também inclui o meio urbano). Pra complicar a guerra, quase tudo que consumimos tem embutido o trabalho semi-escravo asiático, desde o estojo de sombras até o computador de que você precisa pra trabalhar.

Mas dá pra ser feliz consumindo menos e refletindo sobre as nossas escolhas.

Ou você pode simplesmente enfiar a cabeça na terra e fingir que não sabe de nada – de preferência, cobrindo-se com um casaco de pele.