Nova Iorque 2140

Livro da vez: “Nova Iorque 2140”, de Kim Stanley Robinson. Leitura de fevereiro do projeto #lendoscifi, organizado pela @soterradaporlivros.

Finalmente a catástrofe ambiental aconteceu: as cidades a beira-mar foram alagadas devido ao derretimento das calotas polares, a humanidade enfrenta uma terrível escassez e os animais entraram em extinção em uma velocidade nunca antes vista. Nova Iorque foi duramente atingida e o meio de transporte principal da cidade agora é o barco. Apesar disso, milhões ainda moram na cidade, o preço do metro quadrado é mais extorsivo do que nunca e o abismo entre pobres e ricos só aumenta.

O livro nos apresenta os moradores do MetLife, transformado numa mini-cidade com milhares de habitantes, uma horta e até um andar dedicado à criação de animais. Vlade é o supervisor do prédio, Charlotte é membro da cooperativa de moradores, Gen é inspetora de polícia, Amelia é uma celebridade da nuvem (o futuro da internet), Franklin trabalha no mercado de capitais etc. etc. etc. Personagens não faltam, e a eles deve ser somada a própria cidade. Ah, ainda tem o irônico Cidadão, que entre um capítulo e outro explica ao leitor como o mundo se tornou um caos ainda maior do que o atual.

As subtramas da história são excessivas, nem todas são bem amarradas e algumas são francamente desnecessárias. Apesar disso, achei uma leitura excelente e me envolvi com os personagens, amando uns, odiando outros e vivendo na velha nova Manhattan por alguns dias. Não é um livro fácil, não dá pra ler rapidinho. Exige paciência do leitor, mas senti que minha paciência foi mais que recompensada. Seria bacana ver uma série baseada no livro.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

Um Cântico para Leibowitz

Livro da vez:  “Um Cântico para Leibowitz”, de Walter M. Miller Jr.

Mais uma vez fui influenciada pela @soterradaporlivros, mas essa influência aconteceu na pré-história da internet e no mundo real mesmo: no século passado, a Ada me deu esse livro de presente. Fazia uns vinte anos que eu não relia e me surpreendi por não lembrar quase nada da história.

Encontramos o noviço Francis, no meio do deserto, preparando-se para os votos definitivos que ofertará à Ordem de Leibowitz, destinada a preservar o conhecimento antigo. Ele, por sua vez, encontra um velho misterioso que perturba seu retiro ao indicar ruínas que guardam documentos ancestrais.

Aos poucos, o leitor descobre que uns seiscentos anos antes a humanidade foi quase destruída por uma guerra nuclear. Seguiu-se um período de obscurantismo em que a ciência e até a leitura foram banidas, e teriam desaparecido completamente que se não fossem pelos monges da Ordem de Leibowitz, que dedicam suas vidas a preservar o conhecimento.

Mas… desejam mesmo preservar o conhecimento para a posteridade ou escondê-lo com medo de uma nova guerra? Essa é uma das perguntas que a leitura provoca. Outros questionamentos envolvem o embate entre fé e ciência e o caráter cíclico da história – a humanidade está fadada a repetir os mesmos erros?

“Um Cântico para Leibowitz” flerta com a filosofia e provoca questionamentos sobre a condição humana, como fazem os bons livros de ficção científica. Foi a primeira leitura do ano 3 do projeto #lendoscifi. Quer entrar para o projeto? Fala com a @soterradaporlivros.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

As sete mortes de Evelyn Hardcastle

Livro da vez: “As sete mortes de Evelyn Hardcastle”, de Stuart Turton.

Em um lugar meio incerto, num tempo também incerto, um sujeito acorda com a súbita sensação de que precisa proteger uma moça chamada Anna. Essa é a única certeza e a única lembrança do homem, que não sabe nem o próprio nome. No processo de resgatar a própria identidade, ele será enredado num assassinato misterioso e tentará reconstituir a cena do crime, enquanto busca restaurar as próprias memórias.

sse livro é misterioso do começo ao fim e rendeu um belo debate na leitura coletiva organizada pela @tinyowl.reads em novembro. É bem verdade que algumas pontas ficam soltas, mas no geral a trama é bem amarrada. Desenredá-la pouco a pouco (ou tentar) é divertido e ao final vem a vontade de reler só pra ver as pistas que o autor foi deixando pelo caminho.

Se você gosta de histórias de mistério, recomendo fortemente e sugiro que você leia no escuro, sem conhecer sequer a sinopse oficial. Assim, terá a mesma sensação de desnorteamento do protagonista e achará tudo ainda mais intrigante.

Bônus: vai ter série na netflix em 2021.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas

Mãe Pátria

Livro da vez: “Mãe Pátria – a desintegração de uma família na Venezuela em colapso”, de Paula Ramón.

Paula nasceu em Maracaibo, a “Arábia Saudita” da Venezuela, em 1981. Viu sua família aproveitar o razoável conforto dos petrodólares nos anos 80. Em seguida, viveu a desestruturação familiar causada e agravada pelas sucessivas crises político-econômicas, fruto de um governo preocupado somente em perpetuar-se no poder, sem garantir o desenvolvimento sustentável do seu povo.

O relato do que passou a família da autora ecoa o que ouvi repetidamente dos venezuelanos que chegavam em Pacaraima/RR buscando entrar no Brasil como refugiados: a sensação permanente de medo, a fome constante, escolas fechando por falta de professores, falta dos produtos mais básicos, casas saqueadas por vizinhos. O fio de esperança tingido pelo desespero: no Brasil ao menos teriam o que comer, diziam.

O livro se beneficiaria de uma edição em prol de menos repetições e maior coesão cronológica. O ponto forte é o relato ao mesmo tempo emocionante e analítico da Venezuela das últimas décadas. Paula é jornalista, mas em “Mãe Pátria” vai além da reportagem ao compartilhar detalhes pessoais de uma tragédia nacional – e que podia ter sido evitada.

Estrelinhas no caderno: 4 estrelas