Verdade. Honra. Vergonha.

Foi com descrença que li primeiro no twitter: absolveram Renan Calheiros. Achei que fosse piada, um primeiro-de-abril fora de época.

Uma rápida busca pela web mostrou que era sério. Apesar dos sucessivos escândalos que rondam Calheiros há meses, apesar da pressão da mídia e da opinião pública, por 40 votos a 35 o senador foi absolvido da primeira e mais propalada denúncia envolvendo seu nome: o uso de dinheiro recebido de empreiteira para pagar pensão à sua ex-amante, incorrendo em quebra de decoro parlamentar.

Ingênua que sou, esperava coisa diferente, sim. Esperava que o Senado, a casa máxima do Poder Legislativo, guardasse ainda um pingo de dignidade. Tinha a ilusão de que, nem que fosse para angariar um pouco da boa-vontade do eleitorado, os senadores iriam cassar Calheiros. Imaginava que ainda restasse hombridade a pelo menos 41 parlamentares.

Ledo engano.

Ficou patente que a maioria dos senadores desconhece o sentido de palavras como honradez, dignidade, respeito. Sim, a maioria, porque os 6 que se omitiram são tão deslavadamente cínicos quanto os 40 que disseram sim a Calheiros. A corja que habita o Congresso já não teme a imprensa, a opinião pública, os protestos, as vaias. Teme, no máximo, as bravatas do presidente do Senado, que parecem cumprir bem o papel de intimidar quem anda com o rabo preso.

Boa parte da culpa é do eleitorado, que inocentou tantos suspeitos de corrupção nas últimas eleições, que vira e mexe reelege gente sabidamente bandida, desonesta, suja (atualização: sobre a culpa do eleitorado, o Inagaki escreveu muito bem). Outro tanto da responsabilidade vai para as demais instituições: o Judiciário lento, o Executivo subserviente, a classe média calada.

O que podemos fazer? Como lutar contra tanta corrupção? Como evitar atolar nesse lamaçal? Que esperança resta, no meio de tanta imundície? Eu, que não sou otimista por natureza, tento manter a crença de que já estamos no fundo do poço e que, agora, só subindo. Então, subitamente, dão um jeitinho de cavar ainda mais, afundando o país continuamente.

Gregório de Matos Guerra, o “Boca do Inferno”, escreveu no século XVII um texto que continua atualíssimo e não me sai da cabeça há semanas. Referia-se à Bahia daquela época, mas diria o mesmo sobre o Brasil de hoje. Com a palavra, o poeta.

Juízo anatômico dos achaques que padecia o corpo da República em todos os membros, e inteira definição do que em todos os tempos é a Bahia.

Que falta nesta cidade?… Verdade.
Que mais por sua desonra?… Honra.
Falta mais que se lhe ponha?… Vergonha.

O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.

Quem a pôs neste rocrócio?… Negócio.
Quem causa tal perdição?… Ambição.
E no meio desta loucura?… Usura.

Notável desaventura
De um povo néscio e sandeu,
Que não sabe que perdeu
Negócio, ambição, usura.

Quais são seus doces objetos?… Pretos.
Tem outros bens mais maciços?… Mestiços.
Quais destes lhe são mais gratos?… Mulatos.

Dou ao Demo os insensatos,
Dou ao Demo o povo asnal,
Que estima por cabedal,
Pretos, mestiços, mulatos.

Quem faz os círios mesquinhos?… Meirinhos.
Quem faz as farinhas tardas?… Guardas.
Quem as tem nos aposentos?… Sargentos.

Os círios lá vem aos centos,
E a terra fica esfaimando,
Porque os vão atravessando
Meirinhos, guardas, sargentos.

E que justiça a resguarda?… Bastarda.
É grátis distribuída?… Vendida.
Que tem, que a todos assusta?… Injusta.

Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça.
Que anda a Justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.

Que vai pela clerezia?… Simonia.
E pelos membros da Igreja?… Inveja.
Cuidei que mais se lhe punha?… Unha

Sazonada caramunha,
Enfim, que na Santa Sé
O que mais se pratica é
Simonia, inveja e unha.

E nos frades há manqueiras?… Freiras.
Em que ocupam os serões?… Sermões.
Não se ocupam em disputas?… Putas.

Com palavras dissolutas
Me concluo na verdade,
Que as lidas todas de um frade
São freiras, sermões e putas.

O açúcar já acabou?… Baixou.
E o dinheiro se extinguiu?… Subiu.
Logo já convalesceu?… Morreu.

À Bahia aconteceu
O que a um doente acontece:
Cai na cama, e o mal cresce,
Baixou, subiu, morreu.

A Câmara não acode?… Não pode.
Pois não tem todo o poder?… Não quer.
É que o Governo a convence?… Não vence.

Quem haverá que tal pense,
Que uma câmara tão nobre,
Por ver-se mísera e pobre,
Não pode, não quer, não vence.

Dia de Folga em versão Super Trunfo

O Dia de Folga virou carta de Super TrunfoDando prosseguimento ao momento egotrip, informo que o Dia de Folga virou carta de Super Trunfo.

Um povo meio doido – e com tempo livre de sobra – acaba de lançar o clássico jogo de cartas dos anos 80 em versão blogosférica. O Super Trunfo Blogs é uma espécie de ranking altamente subjetivo, totalmente questionável e tremendamente criativo. O Dia de Folga está lá, na companhia de uma pá de blogs que conheço e de alguns dos quais nunca tinha ouvido falar, mas visitarei em breve.

A nota 5 para o layout mostra que é hora de criar vergonha na cara e começar a procurar alguém que dê um visual mais caprichado ao DF. Ei, mas 5 é média, dá pra passar de ano!

9 no quesito “textos” é que foi legal. Agora, 10 em “paranóia adsense”? Logo eu, que nem falo do que dá dinheiro?!

Tem blogueiro falando em imprimir o baralho e armar a jogatina para o próximo BlogCamp. Alguém duvida?

Twitter no Estadão

O twitter e eu - foto de Ed Ferreira para a reportagem do Estadão.Para quem, como a Bia, está se perguntando o que é esse tal de twitter, o Filipe Serrano fez uma matéria para o Caderno Link (O Estado de São Paulo) que dá um panorama do que é o serviço: uma “futilidade útil”, um bombril virtual, com 1001 utilidades.

Eu e o Cris Dias – um dos maiores incentivadores do twitter no Brasil, graças ao seu ranking da twittosfera – fomos convidados a dar pitacos. A reportagem também saiu na versão impressa.

Já que nem a edição em papel nem a online trouxeram os links, aqui vão: meu twitter e o do Cris Dias.

O lado consumista da viagem

São Paulo não é São Paulo sem compras. Essa viagem rendeu várias aquisições. As mais legais:

A Pechincha

Terninho muito bem cortado, com blazer 7/8 forrado, por 70 reais. Garimpado na Rua José Paulino.

A Emergência

Depois de gastar uma caixa de band-aid e continuar sofrendo, uma sapatilha de pano de 19 reais quebrou o galho na segunda metade da viagem.

O Achado

A loja de calçados Banana Price é um parque de diversões para mulheres. Não sou tarada por sapatos como a maioria, mas mesmo assim saí de lá com3 pares. Também tem bolsas. Fica na Alameda Lorena, 1.604, Jardim Paulista.

A Extravagância

Sabe lá o que é pagar 60 reais por um caderno de anotações? Eu sei. Paguei isso numa imitação do moleskine vendida na lojinha da Estação Júlio Prestes pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP).

O Momento Mastercard

A lojinha do Museu da Imagem e do Som fecha às 18 horas em ponto. Quase bati com a cara no vidro, mas o vendedor, com toda a gentileza, reabriu a lojinha para que eu podesse comprar uma lembrança. Surpresa: a única coisa que fazia referência ao MIS era um par de havaianas…

Já indo embora, obviamente de mãos vazias, bati os olhos numa caixa cheia de cartões artesanais e… putz, eu sempre tive faro para achar qualquer coisa em que esteja escrito Star Trek. Lá estava ele, um livreto da Pocket Books com a lombada em amarelo: Star Trek – The Next Generation – Postcards. 30 cartões postais encadernados, celebrando o décimo aniversário de ST: TNG. Que, aliás, foi comemorado há exatos 10 anos.

A capa do livrinho. Segundo minhas googladas, está esgotado. Livreto importado, edição de colecionador. Essas coisas, quando chegam ao Brasil, custam sempre uma fábula. Perguntei o preço, preparada para a facada.

– 20 reais.

– Vou levar!

– Péra, acho que é 20 reais por cartão postal.

– O quê?!

– Só um segundo, vou ligar pra confirmar… Alô, Ana?… Aquele livrinho de Star Trek, ele estava aí, não estava?… Então, é 20 reais cada postal, ou o livro todo?… Ah, o livro todo?… Tem certeza?… Certo…

Nem esperei o vendedor desligar. Ao sinal de “positivo” dele, deixei a nota de 20 e agarrei a sacola com o livreto. Perto da porta, ouço mais uma frase:

– Mas Ana, você tem certeza de que custa 20 reais o livro todo, né?

Saí rapidinho da loja. Vai que a Ana mudasse de idéia.

E antes que digam que Momento Mastercard é aquele que não tem preço, aviso que 20 reais é igual a de graça nesse caso.