Doze Homens e Uma Sentença

Ficha Técnica

12 Angry Men. EUA, 1957. Suspense. 96 minutos. Direção: Sidney Lumet. Com Henry Fonda, Lee J. Cobb, Ed Begley.

Um jovem porto-riquenho é acusado de ter matado o próprio pai. Os 12 jurados se reúnem para decidir a sentença, com a orientação de que o réu deve ser considerado inocente até que se prove o contrário. Onze deles, cada um com sua razão votam na condenação. Hery Fonda faz o papel de Mr. Davis, o único que acredita na inocência do garoto. Enquanto ele tenta convencer os outros a repensarem a sentença, o filme revela traços de personalidade de cada um dos jurados, mostrando as convicções pessoais que os levaram a considerar o garoto culpado e fazendo com que examinem seus próprios preconceitos.

Mais informações: IMDB (em inglês).

Comentários

5 estrelas

12 Homens e Uma Sentença 12 Homens e Uma Sentença foi a estréia do diretor Sidney Lumet no cinema. Feito numa época em que nem se sonhava com a computação gráfica e a magia dos efeitos visuais, surpreende exatamente pela sua simplicidade. Em preto e branco, a história transcorre em uma única sala (à exceção da primeira e da última cenas), pequena e sem ventilação. Ali, reúnem-se os 12 homens com poder de absolver ou condenar o jovem suspeito de ter matado o próprio pai.

No início, o espectador não conhece detalhe algum do crime em julgamento. Todas as informações são passadas durante a deliberação dos jurado que, a bem da verdade, querem terminar o serviço o mais depresssa possível e voltar para suas vidas. Quase todos votam, imediatamente, pela condenação. É Mr. Davis (Henry Fonda) o único voto dissonante, forçando uma longa discussão. Durante os debates, o público descobre o que aconteceu na cena do crime, ao mesmo tempo em que entra em contato com a personalidade de cada integrante do júri.

Mr. Davis, o oitavo jurado, vale-se do princípio da dúvida razoável: se há a menor sombra de dúvida sobre a inocência de um réu, ele deve ser absolvido. Quando lhe perguntam se ele realmente acredita na inocência do réu, Davis responde que não sabe, que talvez não acredite. Para justificar seu voto, acrescenta: “Estamos falando da vida de alguém aqui. Não podemos decidir isso em 5 minutos. Suponha que estejamos errados?”.

A partir de então, o personagem de Henry Fonda, fazendo o trabalho que deveria ter sido executado pelo advogado de defesa, trabalha sobre as provas e as declarações das testemunhas, lançando dúvidas e sombras ao caso. Não há falácia em seus argumentos, apenas o “e se”: e se outra pessoa tivesse uma faca igual à usada para cometer o crime? E se a testemunha estivesse enganada? E se o réu realmente estivesse no cinema na hora do assassinato? Eis a dúvida razoável.

12 Angry Men, além de ser interessantíssimo como “filme de tribunal”, é um excelente estudo de negociação. Davis mantém-se calmo todo o tempo. Numa mesa de negociações, é imprescindível conservar a frieza, responder num tom de voz moderado e, sobretudo, ouvir os opositores. Mr. Davis faz isso, valendo-se das informações de coleta sobre cada um dos outros 11 jurados para levá-los à reflexão. Pouco a pouco, confronta as idéias, evidencia os valores e desnuda os preconceitos de seus opositores, enquanto fortalece sua argumentação. As péssimas condições da sala de júri contribuem para irritar os jurados e movê-los pelo caminho inicialmente mais simples, como fariam negociadores em situações físicas adversas.

Lumet vale-se das ótimas interpretações e da densidade dos diálogos para construir um filme tenso, dramático, psicologicamente rico. Os close-ups são fartamente explorados, concentrando-se nos olhares de cada jurado, quase entrando em seus pensamentos. O filme privilegia a conversa em detrimento da ação, ao contrário de boa parte do cinema atual, e traz uma continuidade tão impressionante que parece filmado numa única seqüência. O espectador quase se sente na sufocante sala do júri.

Além da Tela

No tribunal do júri brasileiro, o voto de cada jurado é secreto e a decisão da maioria determina a condenação ou absolvição do réu; nos Estados Unidos, é necessária a unanimidade para chegar-se a uma sentença. Havendo um único voto divergente, não se proclama o resultado. Todos devem estar convencidos da culpa ou inocência do réu e podem ser necessários longos debates até chegar-se ao consenso.

As vantagens e desvantagens do tribunal do júri rendem extensa discussão e muita polêmica. Há quem diga que várias pessoas pensando sobre o mesmo tema, cada qual com suas habilidades, analisariam as provas sob diversos ângulos, apreendendo elementos que poderiam passar desapercebidos pelo juiz e, assim, chegariam a uma conclusão mais acertada sobre a culpa ou inocência do réu. No caso de culpa, os jurados teriam maior capacidade de colocar-se no lugar do réu e, desta forma, compreender os impulsos, bons ou maus, que o levaram a cometer o crime. O julgamento feito por leigos seria mais de acordo com os valores de cada região, cultura e tempo, valendo-se da eqüidade de um modo que nenhuma lei é capaz.

Por outro lado, os críticos do júri argumentam que seus membros são facilmente levados por seus próprios preconceitos e sentimentos, sendo facilmente influenciados pela empatia gerada com réu, testemunhas, advogado de defesa e promotoria. No tribunal do júri, os casos seriam ganhos ou perdidos quase que aleatoriamente, sem qualquer análise técnica. Testemunhos importantes poderiam ser desconsiderados simplesmente por serem dados por pessoas antipáticas. A imprensa, a defesa e a acusação manipulariam as emoções do júri. Cada jurado estaria sujeito ao seu próprio conjunto de valores, que não necessariamente refletiria o conjunto de valores da sociedade.

Há diversos filmes sobre tribunais de júri. Costumam ser muito interessantes e, embora levem em conta a realidade norte-americana, fornecem elementos e suscitam debates sobre o tribunal do júri no Brasil. Sobre esse tema, um filme recente e facilmente encontrado nas locadoras é O Júri, baseado em livro homônimo de John Grisham, que enfoca a possibilidade de manipulação dos jurados.

O Júri

Ficha técnica

Runaway Jury. EUA, 2003. Suspense. 127 min. Direção: Gary Fleder. Com John Cusack, Gene Hackman e Dustin Hoffman.

Homem misterioso começa a manipular um julgamento envolvendo uma indústria de tabaco e uma viúva. Do mesmo diretor de Refém do Silêncio. Fonte: Guia da Folha de São Paulo.

Mais informações: Adoro Cinema.

Comentários

4 estrelas

É a segunda sinopse que leio que afirma que a trama se refere a uma indústria de tabaco. Na verdade, trata-se de uma indústria de armas.

Sou um tanto suspeita para comentar esse filme. Adoro “filmes de tribunal”. Sempre gostei deles, mesmo antes de estudar Direito (não, não foi por isso que resolvi fazer esse curso).

Em O Júri, somos forçados a refletir sobre a credibilidade dos julgamentos realizados por leigos. É uma questão bastante delicada. A idéia por trás de um julgamento realizado por populares é permitir que os indivíduos sejam julgados por seus pares, afastando-se o legalismo, a frieza das normas e privilegiando-se o clamor das multidões. Supõe-se que, em determinadas matérias, é mais importante atender às aspirações sociais de justiça do que às normas postas em caráter abstrato, freqüentemente inadequadas ao mundo real.

Os críticos do julgamento pelo júri defendem que a emoção trazida ao tribunal por leigos é, muitas vezes, exacerbada, o que pode levar a injustiças. Argumentam que o juiz togado , que estudou por anos o Direito, está mais habilitado a dizer o justo e a dar a medida adequada da pena. Acrescentam que é muito fácil manipular as emoções dos leigos para absolver ou condenar os réus, sendo a decisão final tomada não com base em fatos, mas em prol do advogado/promotor com melhor poder de argumentação ou encenação. Por fim, há o problema dos quesitos, por meio dos quais chega-se ao veredicto, freqüentemente mal formulados.

No Brasil, o Tribunal do Júri tem competência para julgar os réus acusados de crimes dolosos contra a vida: homicídio, induzimento, auxílio ou instigação ao suicídio, aborto e infanticídio. Não sei qual é a lei dos Estados Unidos, mas certamente atribui mais competências ao Júri do que a nossa.

O filme, baseado em livro de John Grisham, é instigante. Faz-nos questionar sobre a real capacidade dos jurados em decidir imparcialmente uma causa. Mostra como pode ser fácil, para alguém competente, manipular o júri a ponto de fazê-lo tomar essa ou aquela decisão. Não se trata, apenas, da manipulação feita pelos operadores da lei, mas principalmente daquela que pode correr nos bastidores, organizada por um dos jurados. Além de tudo isso, esclarece que existe toda uma técnica na escolha das pessoas que farão parte de cada júri – técnica com a qual é fácil vencer, mesmo quando não se tem razão.

Gene Hackman rouba a cena no papel do consultor de júri contratado pela indústria de armas. John Cusack está ótimo. Dustin Hoffman está um tanto apagado, em uma posição de mero coadjuvante, sem grande expressividade.

A Folha de São Paulo deu apenas uma estrela para o filme. Nada poderia ser mais… injusto, na minha modesta opinião. O filme é excelente, o roteiro é ágil e prende a atenção do público, as reviravoltas surpreendem. Como disse no início, sou suspeita por gostar do gênero, mas dou quatro estrelas.

Saí do cinema com vontade de ler o livro. Já está na minha listinha.

Atualização: lendo uma crítica ao filme, finalmente descobri o motivo de as críticas sempre se referirem a uma indústria tabagista – no livro, a guerra é contra uma delas. Fica a pergunta: será que nenhum dos críticos realmente viu o filme?! Como levar a sério a nota baixa dada pela Folha depois de um “fora” tão grande??