50 desapegos

Aposto que você tem um monte de coisa que não usa. Ou de que não precisa. Ou de que não gosta mais (talvez nunca tenha gostado). Aposto mesmo.

Dou uma limpa nos meus armários duas vezes por ano e, mesmo assim, sempre acho coisas encostadas. Imagino o que aconteceria se passasse cinco ou dez anos sem dar essa geral… não, melhor nem imaginar.

Claro, sempre tem aquela gaveta que a gente não quer encarar, a roupa que tem valor afetivo (mesmo que você nunca tenha usado) ou o sapato que machuca o pé, mas foi tão caro que a gente não consegue se desfazer. Adianta mantê-lo guardado? Não, claro que não. Só que exercitar o desapego não é tão fácil assim.

A revista Vida Simples de fevereiro trouxe justamente uma ótima matéria sobre desapego. Infelizmente, não está na íntegra no site, mas você pode ter uma boa noção aqui: Desapego na raça.

O ponto de partida da reportagem é o livro Jogue fora 50 coisas, de Gail Blanke. A autora não se refere apenas a coisas materiais, mas propõe o desapego também de hábitos ou memórias inúteis. Sugere o prazo de duas semanas para o processo. E inclui uma pegadinha: itens da mesma família contam como uma coisa só. Ou seja: 10 livros contam como uma única coisa; 5 cds, uma coisa; 20 peças de roupa, uma coisa.

Casacos - 50 desapegos
Desapegando-me de alguns casacos.

Dei-me um prazo maior: um mês. O mês de março. Dois meses antes do meu aniversário. Dois meses antes do fim do meu projeto “menos é mais”. Alguns meses antes da mudança para novo endereço (porque quero me mudar mais leve).

Comecei timidamente. Depois, com a ajuda de outros olhos, consegui atacar o armário de casacos e vestidos. Impressionante o tanto de coisas que não servem mais, que eu nem lembrava que ainda tinha, que não são bacanas, que não precisam ficar guardadas. Recomendo que você também arraste para a empreitada alguém isenta e sincera, que não tenha envolvimento emocional com as suas coisas. Facilita o processo.

Para inspirar o seu desapego, estou fotografando o meu e subindo para o Flickr, sob a tag 50desapegos. Na foto ao lado, os casacos que vão passear por outros armários. Casacos são (ou eram – espero estar curada!) minha compulsão. Ao contrário da maioria das mulheres, não ligo tanto para sapatos ou bolsas. Casacos são meu ponto fraco – ah, xales, cachecóis e lenços também.

Minha ideia não é comprar coisas novas, porque não preciso de nada. É renovar ares, ganhar espaços vazios e simplificar o dia-a-dia.

Não estou trabalhando a parte intangível da coisa, o desapego aos hábitos inúteis. Talvez, depois de ler o livro, volte a esse ponto – mas só posso comprar outro livro depois de ler as dezenas que ainda me esperam no armário…

Eu tenho muita coisa.

Comecei a morar sozinha em janeiro de 2000. São mais de dez anos, já. Essa semana, estava tentando me lembrar do que tinha naquela época.

A quitinete era tão pequena que tive que optar entre a máquina de lavar ou o fogão. Escolhi a lavadora, claaaaro. Comprei dois armários pequenos para cozinha (desses que vão em cima da geladeira, mas coloquei-os em cima da pia, um sobre o outro). Coloquei uma prateleira e uma cortininha sob a pia para o material de limpeza. O banheiro micro (o box tinha menos de um metro quadrado) ganhou um armarinho sobre a pia.

Na sala, algumas almofadas, aparelho de som, sofá-cama e escrivaninha para o computador “montado”. O quarto tinha um armário embutido grande, antigo, divino-maravilhoso. Uma cômoda de sete gavetas guardava inclusive enlatados e sopas de pacote. A cama de solteiro tinha uma cama auxiliar (com meus sapatos e bastante espaço vazio), seis gavetas e um baú.

E tudo que eu tinha cabia ali, naquela quitinete.

Tudo.

A maior parte das roupas de uso diário.
A maior parte das roupas de uso diário.

Eu tinha bem menos coisas que hoje, mas rigorosamente nada me faltava. E não era infeliz por ter poucas coisas. Não sou infeliz hoje, bem entendido; mas também não sou mais feliz por ter mais coisas.

Nesse exato momento, tenho cerca de 80 livros não lidos comprados em promoções “imperdíveis”. Tenho uma necessaire razoável cheia de maquiagem, uma caixa de bijouterias, uma gaveta de acessórios pra cabelo e pilhas de lenços, echarpes e pashiminas. Tenho uma arara de casacos que só seriam adequadamente usados se eu morasse no Uruguai (Brasília teve um inverno de 30°C este ano!). A arara de camisas, camisetas e afins está tão cheia que as peças amassam. Tenho quase 300 cds e ouço sempre os mesmos 30.

Camisetas e saias.
Camisetas e saias.

Não tenho um closet fabuloso e tal, mas tenho muito mais do que preciso.

Já revi alguns hábitos. Há meses não compro livros; tenho resistido aos lenços e similares (mas fraquejei na liquidação da Accessorize); não compro cds há vários anos; diminuí consideravelmente a aquisição de dvds; e quase não comprei roupas esse ano.

Ah, as roupas. Eis o verdadeiro assunto deste texto.

Lembra que falei de um novo projeto pessoal? Bom, o projeto foi desencadeado pelo Hoje Vou Assim Off e sua proposta de recessionismo fashion, e tornou-se mais concreto quando li este texto do Vende na Farmácia? linkado em algum artigo do HVAOFF.

Vestidos.
Vestidos.

Não sei quantas vezes já ouvi e repeti a expressão “se você não usou uma roupa em um ano, não vai usar nunca”. Há quem fale que o prazo é de dois anos. Sempre tento me lembrar disso na hora de arrumar o armário, mas acabo sendo indulgente: “vou emagrecer”, “vai aparecer a ocasião certa”, “vou inventar uma nova combinação”, “a roupa é tão nova”, “a roupa é tão querida” e por aí vai. Com isso, muita coisa se arrasta sem uso há anos no guarda-roupa.

É verdade que adotei há uns dois anos a política de “se uma coisa entra, outra coisa sai”, mas e a tranqueira que já estava acumulada lá dentro?

Outro dia li uma dica ótima: para saber que roupas você realmente usa, arrume todos os cabides com o gancho pra dentro e, depois de usar a peça, guarde-a com o gancho pra fora (ou vice-versa).

Calçados de uso frequente.
Calçados de uso frequente.

O projeto: partir para o “menos é mais” armário com menos roupa encalhada é mais bacana.

As regras:

  • desde 02 de outubro uso a técnica do gancho do cabide pra dentro/pra fora
  • no caso das roupas dobradas, apelei para a mudança de gavetas conforme uso
  • todos sapatos receberam um papelzinho que será retirado quando forem usados
  • ainda não sei como vou organizar os lenços e echarpes, mas também adotarei alguma tática
  • o que não for usado até 1º de maio de 2011 será doado, vendido ou trocado
Casacos.
Casacos e roupas de festa.

Exceções: roupas de festa (festa mesmo, daquelas que exigem brilhos, plumas e paetês) , lingerie (uso tudo que tenho) e casacos de inverno (os de meia-estação submetem-se à regra, a não ser que Brasília se mantenha nos infernais 30 graus).

Os objetivos:

  • exercitar o desapego e livrar-me do que não uso, obviamente
  • conhecer o que tenho e ser criativa dentro disso
  • aperfeiçoar meu estilo
  • descobrir como andam minhas peças clássicas e básicas (se é que andam)
  • comprar apenas o que realmente for fazer a diferença no guarda-roupa
Todo o resto.
Todo o resto.

Para ajudar, ontem incluí mais uma prática nesse processo: fotografar os figurinos do dia-a-dia. Não vou criar um blog de moda e não vou publicar as fotos. A ideia é formar um catálogo pessoal de tudo que tenho pra ajudar nas combinações. Além disso, é uma ótima forma de ver o que realmente cai bem e o que deve seguir viagem.

Será um desafio. Tenho umas dez ou quinze peças que são praticamente uniformes, a ponto de eu mesma estar enjoada. É aquela coisa de vestir no automático sempre a mesma roupa. Essa revisão em sete meses me obrigará a pensar melhor o visual antes de sair de casa (a menos que eu queira ter apenas essas quinze peças no armário depois de maio). Será um desafio de criatividade. Terei de dedicar algum tempo a isso, mas tenho certeza de que será prazeroso e, ao fim do período, terei aprendido mais sobre mim, meu corpo, meu estilo.

Quando a jornada chegar ao fim, volto pra contar.

Obs.: todas as fotos foram tiradas em 07 de outubro de 2010 (clique nelas se quiser aumentar).