Não queria comentar a atitude insana e absolutamente anti-esportiva do Zidane ontem, na prorrogação do jogo decisivo da Copa do Mundo 2006, porque todos os jornais do mundo já disseram tudo sobre o tema. Claro que o Le Monde insiste que o jogador francês deve ter sido muito provocado para reagir assim – não vejo que provocação seria justificável – e que houve violação ao regulamento, que não prevê o auxílio da imagem televisiva para esclarecer impasses – o quarto árbitro foi o único a ver o incidente e solicitou a reprise para que o árbitro principal pudesse decidir pela expulsão do jogador. Na Blogosfera, este também é o assunto do dia.
O que me leva a criar esta entrada é apenas o desejo de externar minha profunda indignação contra a decisão da FIFA de, ignorando completamente a conduta violenta, indigna e injustificável de Zidane, conceder-lhe o título de melhor jogador da Copa 2006.
Sim, o cara jogou um bolão. Foi o responsável por vários dos lances mais bonitos da Copa. No jogo contra o Brasil, eu estava quase apaludindo os dribles do Zidane em cima da nossa apática seleção.
Só que, no meu entendimento, um evento esportivo mundial deve celebrar, acima de tudo, a integração dos povos e a tolerância entre as pessoas. Não é justamente por isso que a FIFA decidiu, este ano, promover uma campanha contra o racismo, por meio de textos lidos pelos jogadores antes do início das partidas?
Copa do Mundo não é Olimpíadas, mas é do senso comum entender que o espírito olímpico deve estar presente: a competitividade saudável, a colaboração mútua, o respeito a valores tidos por universais – honestidade, cooperação e, acima de todos os outros, paz. A cabeçada do Zidane é a antítese de tudo isso. Registrou-se um dos momentos mais tristes do esporte mundial. Foi deprimente, e confesso que fiquei mesmo com pena do Zidane, pelo fecho melancólico que ele próprio criou para sua carreira brilhante. Por mais que se lamente, no entanto, é tremendamente injusto premiar um jogador após cometer tamanha agressão. É passar ao mundo a mensagem “tudo bem, o que o Zidane fez não foi nada de mais”, quando foi, sim. É referendar um comportamento intolerável vindo de qualquer pessoa e, especialmente, de um esportista de alto nível, cuja imagem influencia milhares de fãs.
Não se diga que ele foi magnífico durante a Copa inteira e que esta foi só uma escorregadela. Um só ato indigno deveria ser o suficiente para diferenciar Zidane de jogadores como Cannavaro e Pirlo que, além de mostrarem um bom futebol, agiram com respeito e esportividade.
Há tempos, uma empresa veiculou uma propaganda falando da importância que um segundo pode ter numa vida. A cabeçada do Zidane é um típico exemplo disso. Aparentemente, porém, os valores andam tão esquecidos que nada mais realmente conta.
Parabéns à Itália pelo tetracampeonato. A França jogou melhor até a saída do seu craque, é verdade, ficando completamente desnorteada depois (mais um fato que deve estar pesando na consciência de Zidane agora). Não foi capaz, entretanto, de converter sua supremacia num gol decisivo. A Itália fez uma campanha bonita e saiu de um jejum de 24 anos, espantando o fantasma de 1994, quando perdeu a Copa para o Brasil, também numa decisão por pênaltis. Agora temos, novamente, uma seleção na nossa cola em número de títulos mundiais.