07 de Setembro

Não sei se é em todo canto, mas aqui em Brasília feriado é feito pra se ficar em casa. Se você quiser fazer qualquer outra coisa, até pode tentar, mas só se tiver a proverbial paciência de Jó.

Esse ano, nem dei uma olhadinha na tevê pra ver os desfiles, coisa que sempre fiz. Eu gosto dos desfiles do Dia da Independência. Mas acho que essa lama toda dos últimos meses andou afetando meu patriotismo.

Aí é demais!

Sabe, a pior coisa de Brasília no mês de julho não é a seca, que faz o nariz sangrar, os lábios racharem e a pressão arterial despencar.

Também não é a paisagem, com cara de deserto-que-um-dia-já-foi-verde.

Tampouco são as crianças lotando shoppings e infernizando consumistas como eu, que visitam esses templos em busca de paz espiritual no fim do dia e deparam-se com gritinhos, birras e correria.

Nem a saudade que bate dos amigos que estão aproveitando as férias em outros cantos.

O pior de Brasília, nesta época do ano, são os turistas absolutamente inconvenientes que brotam por aqui.

Realiza a cena: Esplanada dos Ministérios, hora de maior movimento. Um turista dirige b e m d e v a g a r z i n h o pelo Eixo Monumental, enquanto seu companheiro aproveita para fotografar o Congresso Nacional de dentro do carro mesmo. Um motorista local quase enfia a frente do carro na traseira do sossegado excursionista.

Olha essa outra: Praça dos Três Poderes, duas horas da tarde. Uma simpática senhora simplesmente PÁRA o carro NO MEIO da rua para, adivinha só?, isso mesmo, tirar fotos. Ela não parou na pista mais à direita que, aliás, já estava quase tomada pelos ônibus de turismo. Ela parou NO MEIO da rua. Visualizou?

As sortudas pessoas que estão de férias na Capital do Brasil parecem não perceber que aquilo que para elas é ponto turístico, para outras milhares não-tão-sortudas é local de trabalho e via arterial.

E, antes que me joguem tomates podres, não estou falando mal de todos os turistas, apenas dos “absolutamente inconvenientes”. Você não é um deles.

“Porque, se você parar pra pensar…”

Às vezes, a gente precisa levar um chacoalhão para perceber o quanto a vida é frágil.

Na terça-feira passada, jantei com amigos muito queridos. Durante o papo, combinamos uma festinha na casa de um deles, para a sexta-feira.

Na sexta de manhã, liguei para o dono da casa a fim de acertar alguns detalhes. Ele me perguntou: “Lu, você já sabe o que me aconteceu?” Respondi que não, sem entender. Então, ele explica.

Meu amigo sofreu um seqüestro-relâmpago na quinta-feira à noite. Passou mais de uma hora nas mãos de três bandidos. Foi aterrorizado e humilhado. Teve a certeza de que ia morrer.

Graças a Deus, sobreviveu.

A festinha aconteceu. Quando foi combinada, era pra ser uma reunião sem motivo. Acabou ganhando a motivação de comemorarmos a vida do nosso amigo.

Não quero, aqui, entrar no mérito da violência crescente em Brasília, da bandidagem, da onde de seqüestros-relâmpago. É tudo sem sentido, eu sei (e Renato Russo já disse isso).

Fiquei com ódio dos bandidos, claro. Quem me conhece, já sabe que não tolero ouvir falar em “direitos humanos” para quem não tem o menor respeito pelo seu semelhante. Fiquei com medo, também. Estou assustada até agora, de fato.

O que mais me assombrou, no entanto, foi o que não aconteceu, mas poderia. Foi saber que o amigo com quem almocei na terça e que tinha a certeza de rever na sexta poderia ter morrido na quinta.

Quando morre alguém amado, percebemos como a vida é um sopro. Quando alguém escapa da morte, também.