O assunto escolhido para abrir o projeto Nossa Opinião, criado pelo Ricardo Cabianca, é a doação de órgãos. Nada mais apropriado para inaugurar a iniciativa, visto que este ano faleceu um membro querido da blogosfera, Aldemir Silva, cuja história mobilizou vários blogueiros em prol da doação de órgãos e de sangue.
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Faces do problema da doação de órgãos
No dia 27 de setembro foi o Dia Nacional do Doador de Órgãos. Não houve o que comemorar: pelo terceiro ano consecutivo, houve queda no número de doadores de órgãos. Em 2004, tínhamos 7,3 doadores por milhão; no primeiro semestre, a proporção era de apenas 5,4 doadores por milhão (via Agência Brasil). Para tentar reverter esse quadro, o Ministério da Saúde iniciou uma campanha sobre a importância da doação de órgãos.
A questão é mais complexa e deve ser atacada por várias pontas. Conscientizar futuros doadores é fundamental, mas insuficiente.
Imagine a dor que é perder um parente, o sofrimento dos familiares que precisam se despedir e, ato contínuo, preparar o enterro. A dor nos faz mais egoístas – quem pensará, no meio do desespero, em doar os órgãos do parente que se foi? Vai daí que é absolutamente indispensável, para aumentar o número de doações, que os hospitais contem com equipes treinadas para orientar os familiares, apresentando-lhes a doação como um ato simbólico de continuidade da vida que se encerrou, ou um gesto de solidariedade que pode evitar a mesma dor a diversas famílias.
De outro lado, há o descalabro do atendimento público de saúde. Como pedir que aquele pai que viu o filho morrer por falta de cuidados tenha o necessário desprendimento para ajudar outros pais? Claro que uma omissão (do serviço público) não justifica outra (do parente), mas quem consegue ser tão racional na hora do vamos ver? De novo, tem-se a necessidade de assistentes sociais e psicólogos preparados para orientar as famílias – além, obviamente, de uma rede pública de saúde decente, direito constitucional vilipendiado cotidianamente.
Além disso tudo, também faltam aparelhagem, pessoal e logística adequados para conservar o corpo do doador, captar cada órgão, encaminhá-lo ao receptor e realizar o transplante em tempo hábil. Todo esse trabalho deve ser feito em poucas horas, de modo coordenado e integrado ao longo do território nacional.
Para completar o cenário e diminuir as esperanças de quem precisa de uma doação para sobreviver, somam-se a falta de informação ou de solidariedade dos futuros doadores e das suas famílias. É aí que cada um pode ajudar.
O que você pode fazer
Está claro que eu e você não podemos solucionar os problemas do serviço médico, nem contar com a boa vontade e eficiência de cada hospital. Efetivamente, resta-nos conscientizar quem está ao nosso redor.
Somente o cônjuge, filhos, pais (na ausência destes, os avós) ou irmãos maiores de 18 anos podem autorizar a doação de órgãos. Eles é que devem ser informados do seu desejo de ser solidário após a morte. Converse com eles. Convença-os. Deixe seu desejo por escrito, se achar que será mais efetivo. Na hora da perda, todo mundo olha apenas para si mesmo – um documento escrito, por mais informal que seja (juridicamente, ele não tem nenhum valor), pode ajudar sua família a lembrar-se da sua vontade.
Ah, você ainda não sabe se quer ser doador? Bem, quais são suas dúvidas?
Ninguém vai matar você antes da hora para retirar seus órgãos – isso é lenda urbana, parente daquela de acordar numa banheira cheia de gelo e sem um dos rins.
Se existir uma vida eterna, você não precisará do seu corpo físico nela. Nenhuma religião – nem mesmo as testemunhas de jeová, que proíbem a transfusão de sangue – é contra a doação de órgãos. Por outro lado, se seus órgãos forem doados, quem sabe você não ganha uns pontinhos com Deus, Alá, a Deusa ou sei lá quem?
Se você é ateu e acha essa história de vida eterna uma grande bobagem, bem, então deve dar um enorme valor aos 70 anos que passamos sobre a Terra. Que tal ajudar algumas pessoas a ficarem juntas por mais uns anos, ou décadas?
Você sabia que cada doador pode ajudar mais de 20 pessoas? Agora, multiplique essas pessoas pelo número de familiares e amigos e terá alguma dimensão de quantas vidas podem ser modificadas por um gesto simples.
Informe-se, leia, pesquise. Transmita as informações à sua família e amigos. Dezenas de vidas podem ser salvas com a sua ajuda, agora e após a morte.
Referências
Não espere a morte
Se você tem mais de 18 anos e boa saúde, pode cadastrar-se como doador de medula (exige-se autorização judicial e consentimento dos pais se o doador for civilmente incapaz). Para a doação de sangue, também é necessária a idade mínima de 18 anos e o atendimento de alguns outros requisitos.
Mais informações sobre postos de coleta e condições para a doação de medula e sangue: