Você já deve ter visto por aí um lacinho rosa usado como símbolo da luta contra o câncer de mama. Há até uma corrente famosa em que um homem usa um laço rosa na lapela e, ao ser abordado por outros em tom de deboche, explica-lhes que exibe o laço justamente para ter a oportunidade de falar sobre o câncer de mama e sobre a importância de incentivar as mulheres a fazerem exames regulares.
A história do laço rosa começou em 1991, com a Fundação Susan G. Komen (que ainda existe e dedica-se a arrecadar fundos para pesquisas voltadas à cura do câncer de mama.) Motivada pelo laço vermelho usado um ano antes por Jeremy Irons para chamar a atenção para os portadores de AIDS, a fundação distribuiu laços cor-de-rosa para as participantes da Corrida pela Cura do Câncer de Mama, realizada em Nova Iorque no outono. Segundo o artigo Pretty in Pink, o movimento cresceu de verdade no ano seguinte, impulsionado pela revista Self (especializada em beleza e saúde) e desde então virou mania.
Desde a gênese do movimento, questionam-se as intenções comerciais por trás do laço cor-de-rosa e dos produtos que surgiram no seu lastro – em nome da prevenção e do tratamento do câncer de mama, inúmeras empresas lançam produtos cor-de-rosa, principalmente em outubro, prometendo a doação de parte dos lucros para instituições deidcadas à doença.
Essa exploração comercial do câncer de mama por empresas não-tão-comprometidas-assim motivou o surgimento de uma contracampanha: Think Before You Pink, (mais ou menos “Pense Antes de Usar Rosa”), que desde 2002 alerta potenciais consumidores para que se perguntem se o merchandising feito por tantos produtos em torno do câncer de mama é mesmo útil ou se não passa de mais uma fonte de lucro.
Algumas das questões levantadas pela contracampanha:
- Do que você paga pelo produto cor-de-rosa “engajado”, quanto realmente é doado?
- Quanto dinheiro é gasto no marketing do tal produto?
- Como e por quem o dinheiro doado é aplicado?
E conclui: “se consumir curasse o câncer de mama, a esta altura ele já estaria curado.”
Ora, nem tanto ao céu, nem tanto ao mar. Não sejamos tão crédulos e nem tão cínicos.
Vivemos em um mundo movido pelo lucro. Dizer o contrário é hipocrisia e remar contra a corrente é perda de tempo e de esforços. A busca do lucro gera mazelas, sim, mas também é a responsável pelo progresso. É o lucro que motiva o surgimento de grandes invenções, como as que tornam possível que você esteja lendo, agora, este artigo. Se não fosse pela corrida atrás do lucro, pedras e barro fofo seriam até hoje nossas ferramentas mais modernas, doenças banais matariam milhões todos os anos e ver o tempo passar seria nosso lazer principal.
Descartar boas iniciativas só porque geram lucro para alguém não faz de você uma pessoa mais consciente. O que a faz consciente é reconhecer motivações e, mesmo quando não são as melhores ou as mais coerentes, enxergar o que delas pode ser posto a serviço de causas bacanas.
Veja só, eu não ganhei nem um centavo nas últimas semanas para falar sobre o câncer de mama. Você não pagou nada para aprender, emocionar-se ou refletir um pouco mais sobre o assunto, aqui nos vários blogs que participaram do Outubro Rosa. Talvez, se não houvesse em 1992 um interesse comercial de revistas e marcas de cosméticos, não tivéssemos passado este mês conversando sobre o tema.
O Pink Ribbon Day (“Dia do Laço Rosa”), que acontece na próxima segunda-feira, 27 de outubro, tem por objetivo arrecadar dinheiro para a pesquisa, prevenção e cura do câncer de mama. É promovido pela National Breast Cancer Foundation, fundação australiana sem fins lucrativos. Você pode contribuir comprando um dos produtos cor-de-rosa (é preciso ter cartão de crédito internacional e pagar 15 dólares de frete) ou fazendo uma doação de qualquer valor (via cartão ou PayPal).
Ou pode, simplesmente, aproveitar o pretexto e conversar sobre o câncer de mama, como aquele moço fictício da corrente. Pode se lembrar de, na próxima segunda-feira, orientar sua secretária, sua amiga, sua colega de trabalho ou sua mãe sobre a necessidade da mamografia periódica. Pode explicar sobre as vantagens da detecção precoce do tumor e sobre a importância de ir ao ginecologista habitualmente.
Aliás, como está a sua saúde? Já marcou sua consulta anual?
Imagem: Wikimedia Commons.